Eles
passam por mim. Ou passo por eles nos balcões, nos caixas ou nos bancos
debruçados. Alguns com um livro preto embaixo do braço outros não. Vejo-os carregando
algum compendio qualquer, com ou sem mochilas; outros jogam dominó, e a vida é
uma luta diária.
Cultuam
o corpo, mexem nos cabelos, cofiam a barba, olham-se no espelho ou qualquer
coisa que os reflitam - muitas vezes é somente este significado que dão para o
termo “refletir”; e amam, geralmente: condicionalmente.
Conferem
o interior da vitrine, compram, pagam, devem, endividam-se e roubam; se
martirizam e prometem mudar. Fiéis ou infiéis, casam, abandonam, formam o que
entendem por família e ainda que despreparados, em algumas situações acertam;
apanham muito e lutam bastante.
Trabalham,
enganam, viajam, pesquisam e distribuem prêmios entre si. Descobrem coisas, aprendem
o que lhes é útil e o que não é; e ainda assim continuam lutando.
Divertem-se;
com paixão: vibram em frente à televisão, ouvem os mais diversos tipos de
música, vão a shows e aos estádios ou participam em grupos de manifestações, e
lutam e convencem-se de que adquiriram mais direitos; comemoram migalhas.
Estudantes, esportistas ou donas de casa. Empregadas. Eles,
elas e os outros; bancários, banqueiros e industriais: inconscientes de suas
inconsciências percorrem diariamente o limbo do cotidiano da luta que não
cessa; que os mantém vivos e sentido-se parte de algo que ainda não foi
decifrado pra que serve realmente.
Guerreiam,
declaram paz, se armam, se odeiam, confundem as coisas, acreditam, votam, leem
jornais, se unem e lutam.
Nas
sinagogas, nas igrejas, nos templos ou mesquitas, somados aos respectivos
vigários, praticam o que entendem por fé - alguns o fazem realmente. Cada qual a
seu modo acredita no que entendeu até então ser correto, todos são livres, é
fato; e é justamente por poderem exercer esta liberdade que são presos no
emaranhado daqueles que a temem, ou do medo de sê-lo.
Todo
o processo é uma luta contínua, não há descanso. Alguns menos abastados invejam
aqueles que adquiriram posses. Outros que não podem parar; se pudessem
observar, o faria de onde está, pois a vida privilegiou-o com parte do poder;
aos dois sobrou apenas a luta que mata aos poucos por quase nada.
Enquanto
passam os observo; toda esta luta não é em vão, mas quanto economiza, quanto
desgaste evita aquele que busca realmente entender o objetivo disso tudo.
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