sábado, 27 de julho de 2019
Execração hipócrita
023.r cqe
Das marionetes, títeres e ventríloquos
(...)
Comparados com os dos teocratas, os teatros de marionetes erguidos pelos
dirigentes totalitários são algo quase insípido. Também eles suscitam um boneco
recheado de estopa que enfrenta a Criatura e disputa a vontade do público menos
avisado. Para os nazistas, esse boneco perverso eram os judeus; para os
comunistas, era a burguesia internacional e a economia de mercado, que como
todo mundo sabe, são feitas da pele do diabo (e isso é quase a única coisa que
alguns sabem e querem saber sobre essas coisas). Essa pendência do mais alto
nível no teatro de marionetes coletivista acaba por embargar a atenção dos
espectadores e facilita o rapto de suas liberdades pela e para a Criatura.
Tanto aparato e colosso no espetáculo (o suposto enfrentamento entre entidades
sobre-humanas) são, evidentemente, parte essencial para capturar a
disponibilidade dos congregados, ao fazer que se sintam pequenos e
insignificantes diante do que ali transcorre.
Com truques tão absurdos e de tão baixa
qualidade intelectual, líderes monoteístas, nacionalistas e marxistas têm,
ainda hoje, as vontades de milhões de pessoas dominadas em todo o mundo. A
coisa seria para levar na brincadeira, não fosse o fato de já sabermos como é
perigoso todo esse teatro montado por titereiro intelectuais empenhados em nos
fazer acreditar na existência de Criaturas coletivas e sobre-humanas, e no fato
de que sua vida e suas paixões não apenas existem, mas são infinitamente mais
valiosas que as das pessoas de carne e osso; você e eu, sem ir mais longe. Por
mais pueris e primitivas que sejam essas artimanhas, não podemos desdenhá-las
(entre outras coisas, porque até quem manipula as marionetes chega a acreditar
nelas): demonstraram sua efetividade, seu poder para que os donos do teatro de
bonecos pastoreiem multidões inteiras e as confrontem com outras multidões.
Por mais imponente que seja o modo como
os ventríloquos da política (ou da religião) apresentam seu espetáculo, por
mais prosopopeia que derramem para preparar o seu show para o público, nunca se esqueça de que aquilo é um teatro de
marionetes recheadas de estopa. E faça como Lili: puxe com força a cortina e
descubra que sempre há um ventríloquo por trás, mais ou menos interessado em
sustentar o engano, mais ou menos interessado em apoderar-se de sua vontade
para alimentar a dele, já bastante inchada. Se quer me ouvir, libre-se de
Platão e de tolos que fizeram e fazem da política uma variante da arte da
ventriloquia; e corra, corra mais que suas próprias pernas. p252
Carta Aberta
de Woody Allen para Platão,
cinema e
filosofia.
Planeta.
Juan Antonio
Rivera.
022.r cqe
sábado, 20 de julho de 2019
Responsabilidade política*
...
Somos uma mentira como pessoas; como seres
responsáveis. Somos uma comédia; uma piada.
Nossa cultura é baseada no que nos
vem sendo apresentado há milênios, não é culpa nossa, mas cada um por si é
culpado se assim mantê-la.
*
Em meio ao todo que pertencemos eles elegem um
que outro que se destaca; um em cem milhões. Uma representação. Na intenção de
dar provas, de convencer – é preciso manter latente a ilusão de que é possível.
Ter essa possibilidade vendida amarra a todos a uma ilusão, outra ilusão, outra
de tantas ilusões. Fazendo com que a atenção destes seja focada em algo que
será descoberto ser outra mentira somente muito tarde, quando já não se têm
mais forças para lutar.
Possuir uma casa, um carro, vez ou outra um churrasco
com os colegas sempre com muita bebida, poder ir às férias até uma praia
próxima, se não desta vez; a velha cachoeira que viemos poluindo ainda serve.
Condicionou-se isso a uma filosofia de estar bem; não precisamos de mais, esse
é nosso modelo de hedonismo.
*
Não
nos permitem senso nem mesmo para assumirmos a nossa condição de passividade,
da filosofia risível das hienas. Chafurdando sobras entre alegrias compradas.
Assumimos, apreendemos, assimilamos tão somente, que não devemos olhar para o
próprio umbigo na situação de miserabilidade de ser em que sobrevivemos. Nada;
antes, devemos olhar para o outro, não o outro que está bem, mas o outro que
está mal. Aquele que está pior que a gente. Destarte, no desespero, ficamos
procurando alguém que esteja em pior condição para avalizar a nossa condição de
mendicância e, da angústia insolvível, acabamos auto aplaudindo nosso estado de
comiseração - vivemos aos solavancos, de mágicas, de milagres extraordinários,
para o bem e para o mal; inexplicáveis em um universo razoável. Em
contrapartida, a gente olha, somos treinados a olhar para um que está bem no
sentido a entender que também podemos chegar lá. Somos instruídos a olhar para
alguém distante que está bem – um “vencedor” - no sentido de que a gente pode
se espelhar neste, que podemos chegar ao mesmo nível, mas no momento precisamos
compreender que estamos em uma situação complicada e a sociedade insiste, com
doutores, especialistas, amigos, parentes, psicólogos: que era interessante que
entendêssemos isso apenas como um processo, logo tudo será diferente – mas
nunca será; ao menos para a imensa maioria de nós – e paulatinamente aceitamos
isso como uma condição de tranquilidade, quando não é a condição ideal. É uma
filosofia plantada que, uma vez aceita; confundidos, somos conformados com um
estar bem anódino, um estar igualado a todos, que é assim – por enquanto,
contentemo-nos; quantos outros estão em situação ainda pior que a minha - este
é o processo... mas, se é natural ou apenas vinculamos como natural, isso exige
graus outros de entendimento.
*
Se não pudemos ser hedonistas puros; mudamos as regras
do hedonismo - Não nos movemos mais observando filosofias onde os valores,
dignidade, razão e justiça, por exemplo, mereçam ser trabalhados – nem mesmo
tocados. A única coisa hoje que avalia – e avaliza -; o cânon, a condição de
indivíduo presente: é a situação monetária, econômica, este é o pré-requisito
abre-alas para sua aceitação.
*
Trabalha-se
voltado ao plano físico. Toda nossa estrutura vem se desmantelando: estrutura
passada de irmandade, o sagrado, a religiosidade, a família; pra que a atenção
se volte ao plano físico. Ao aqui agora material – urgência míope. Não existe
mais uma preocupação com o depois, com o vir a ser. A ocupação agora é a
sobrevivência cômoda – “estar existindo”. O estar bem materialmente, vencer
agora, ou pelo menos sobreviver monetariamente vestindo camisas Lacoste, mesmo
que sejam produzidas pelo trabalho escravo da China, da Indonésia, das
Filipinas e contrabandeadas através do Paraguai.
“Um dia me
disseram, quem eram os donos da situação, sem querer eles me deram as chaves
que abrem esta prisão.”
“Quem ocupa
o trono, tem culpa; quem oculta o crime, também. Quem duvida da vida, tem culpa,
quem evita a dúvida, também tem.”
Engenheiros do Hawaii
*Responsabilidade
política aqui representa e abrange toda ação de um ser sobre o outro que teve a
chance de obter instrução, mesmo que exemplar, antes de agir – pais,
religiosos, políticos, empresários, agenciadores e todos aqueles que em algum
momento lideraram ou mesmo liderou um único que fosse -; sendo ele um
representante assumido ou não, ciente ou não do senso, do juízo de
comprometimento, mas, e, principalmente, a todo o ser pensante que, sob a
desculpa de não ter provocado o estado vigente se enfronha nos meandros sociais
e se entende alheio ao imbróglio herdado sendo ainda mais responsável por
qualquer desvio a um terceiro se, ao perceber a impossibilidade de qualquer ação
altruísta, ainda assim continuou, agora, mimetizado a escória.
021.r
cqe
sábado, 13 de julho de 2019
Responsabilidade em meio ao amadorismo
...
A primeira
questão colocada observando o comprometimento, a consciência e a sensatez com o
que entendemos sobre nossas obrigações, aborda um tomo paradoxal com respeito
ao aumento da responsabilidade do indivíduo diligente em meio a um ambiente
cujos associados, a cada dia mais, agem evidenciando quão irresponsável
tornaram o comportar-se como um todo.
À medida
que a evolução traz comodismos, inexoravelmente, nossas responsabilidades são
exigidas e elevadas a outros graus de atenção, obrigatórios na equalização do
senso crítico comum; mas, contrariamente a esta realidade o que se vê é o
descaso trivializado por conta de ferramentas, artifícios e afrouxamento na
educação didática e, principalmente, onde a ausência de comprometimento causa
mais estragos: nas práticas familiares; por ser aí que se principia a
vinculação com esta cultura.
Volume =
barato; no entanto... - Os comodismos que obrigatoriamente avançam em maior
proporção que a conscientização ou a contextualização somados portanto as
gestões arvoradamente amadoras têm construído ambientes propício à delinquência
da idoneidade garantindo e consequentemente aumentando exponencialmente grupos,
associações e maltas de maus intencionados que, com o salvo conduto da
desorganização, controles falhos, burocracias (inoperantes), a utilização do
expediente “massa de manobra”: atores baratos que, pensando misturar-se ao jogo
– espúrio -, acintosamente se deixam comprar; contribuem a, a partir deste
quadro, se deitar sobre as mais inauditas zonas de conforto e, nestes palcos
provisórios, o conformismo encontra terra fértil para relaxar sobre vontades
tão abastadas quanto veladas; tornados agora, membros de um organismo que
baldado, subjetivamente objetiva; sob regras absurdas do funcionar puro e
simples, por meio de pessoas/ferramentas que ao não pensar apenas atuam sem ser
atuantes; só executam.
Infiéis
também aos seus - Apontado nestes termos é possível entender porque a
engenhosidade da classe dominante trabalha com um coeficiente de cagaço
elástico, - superestimado por conta de uma infidelidade mútua; rescaldo,
rebarba, uma espécie de escória não reciclável do negócio - prevendo,
justamente, a falibilidade de suas ferramentas orgânicas. Ao menos no nosso
entorno sócio/político os donos do mercado entendem que não é possível exigir
mais comprometimento da massa humana que aí está; então são eles obrigados a
tomar medidas para que o descompromisso das classes não venha colapsar a
corporação – o sistema por eles planejado.
Se o movimento das galeras é trabalhado para uma mecânica obtusa cabe aos
engenheiros encontrar soluções elásticas, porém cercando, delimitando o senso
inapropriado das ferramentas orgânicas que se movimentam aleatoriamente sob
vontades; as mais inexplicáveis. No entanto cabe aqui a pergunta “como?”; se a
final a própria engenhosidade se deteriorou ao ser também infectada por uma
espécie de osmose atávica com o vírus do amadorismo.
E é ai,
solitário, esquecido, fadigado, sempre calado, mas consciente do seu
comprometimento – no entanto devidamente lesado por suas necessidades prementes
-, que entra o burro-de-carga e escasso agente responsável; por sê-lo, este não
consegue circular alheio ao amadorismo generalizado que assiste e então sua
responsabilidade torna-se um fardo por seu tino de obrigatoriedade e prática do
bom companheirismo cobrar-lhe atitudes que suplantam suas cotas de afazeres.
*
Defesa -
...não caberá prescrições de pena, afinal, pode ser considerado responsável de
mesmo peso aquele que se mantém obrigado, alheio a irresponsabilidade alheia,
pois, ético, obriga-se com o todo que orbita e a carga de culpabilidade com
respeito as falibilidades naturais ao construto da obra é portanto passível de
atenuantes por conta de abnegados esforços uma vez que persistiu junto aos
demais prevendo o que nenhum deles fora capaz, principalmente se observarmos que
sempre o mantiveram “amordaçado”?
Homenagem a Hans Jonas
“(...) o modo peculiar da transitoriedade de toda a
vida é que faz dela unicamente um objeto próprio do cuidado”.
Hans Jonas
020.r cqe
segunda-feira, 1 de julho de 2019
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