sábado, 15 de maio de 2021

Investido de nada


Era ainda década de 90 quando participei de algo que há época considerei um evento; fui iniciado no primeiro nível do Reiki. Novidade ao pretenso neófito ansioso ainda nos cueiros - sempre ponderei positivamente a sacralidade das minhas buscas. Um grupo muito pequeno. Comemoramos quando finalmente o instrutor pode se deslocar de São Paulo à Curitiba. Dois ou três dias fechados como jurados quase incomunicáveis com o mundo exterior. Um clima sério, respeitoso e solene sem ser teatral, nada de extravagante; o mestre, sempre compenetrado passou ensinamentos sínteses com a sobriedade devida ao evento.



Passados quinze anos o Reiki foi também banalizado. Tornou-se uma fonte de renda para vários iniciados; conheci um indivíduo que contou ter participado de um aglomerado que o formou no primeiro nível e como ficou amigo da professora recebeu um certificado da conclusão do segundo, de graça.



Devido ao valor, não fui iniciado no segundo nível. Era o dobro do preço pago para obter o primeiro para trazer o instrutor da capital paulista e a organizadora não conseguiu o número mínimo para ratear esse valor e desde então nunca mais toquei no assunto.



Talvez se procurasse a professora do meu colega seria mais fácil, teria o segundo e o último ao preço da metade do valor que investi no primeiro.



Sendo um mero iniciado do primeiro nível não me investi de apto a sair curando, ou propalando ser um reikista. O mestre havia dito que os três níveis eram essenciais para a iniciação total, e daí então se expor a esta forma de medicina alternativa.

O que é ser investido? O que é iniciação?



Quando se é um iniciado o indivíduo se apossa de certo grau de participação, de capacitação; ele aglutina algumas energias, conhecimentos, história de organizações eruditas; versadas.



Quando se escolhe ser budista, Rosacruz, católico, pentecostal, maometano etc., se é apenas a parte rasa da coisa, nem mesmo deveria se considerar budista, espírita, pentecostal etc. e tão somente um membro que acolheu uma dessas –ora tão somente - nomenclaturas para seguir. Para atingir o que a maioria alardeia é outra história. Até poder sentir-se investido de algo milenar, o cainho é extremamente longo.


Não é possível incorporar milênios de Doutrinação Budista em uma existência. Como também não é possível incorporar, se investir da Energia Crística em uma única vida. Não é possível mudar de nome, frequentar sinagogas e templos por alguns anos e se investir de maometano, muçulmano ou judeu ou o que quer que seja. Nestes casos se é um mero partícipe; um partidário.



Minha colega contou que sua vizinha, cambona em um centro espírita, paga de nariz empinado na vizinhança por sê-lo; como se isso não bastasse, dia desses disse que se determinado cachorro continuasse a latir próximo da sua casa iria dar um jeito nele. Isto não é ser espírita, é simplesmente frequentar um local assim nomeado.



Há tempos tornamos as religiões, seitas e doutrinas, verdadeiras facções. E algumas delas, não sei como: salvo conduto para violentar.




Alguns poucos que souberam, em notas de imprensa; vieram me cobrar, até de forma capciosa, como se eu tivesse sido afetado, como se minha simpatia por minha identidade com a doutrina budista devesse ser atacada qual reles torcedor de um destes times qualquer que arrastam multidões; quando em Mianmar durante o que foi considerado uma “limpeza étnica”, foram praticadas atrocidades e uma série de carnificinas de uma facção budista conta o povo Ruainga.

Envergar bandeiras é para os tolos tanto quanto comentar como se a provocar inveja aos demais sobre as posses de um vizinho, parente ou pastor da congregação da vez. Nada é meu. Não tenho nada. Não temos nada. O que podemos ter é vontade, porém mesmo essa, há muito, parece também não ser nossa.





Qualquer coisa, por maior que seja ou possa parecer e como com ela simpatizo; não sou esta coisa. Sou um mero adepto. E sempre que ajo em nome dela e prejudico algum terceiro, esta força, então sim, contribuirá para isso, mas ela não é culpada, mas você: que se disse sempre dela investido.


 Este texto é dedicado a Plínio Cutait meu Mestre em Reiki

 

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