sábado, 1 de setembro de 2018

Ser humano, hoje




Ser humano hoje é coabitar em meio a uma miscelânea de incompreensões e desentendimentos convictos de que ainda que sejamos sufocados por dezenas de atribulações entendemos estar bem em um mundo muito melhor do que o vivenciado por nossos antepassados.

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Deparar-nos-íamos em um absurdo estado de incongruências se nos comprometesse a imaginar como seria a condição particular de cada indivíduo por mais imparcial e precisa que fosse a forma encontrada para avalia-las. Como trabalham seus raciocínios nas suas particularidades. Principalmente porque a cada dia menos resistimos na singularidade ou existimos no individual, e também por conta do camuflar cada vez mais obrigatório exigido para se manter minimamente conectado a comunidade. A criatura totalmente despreparada está por sua conta e risco, afora alguns meios abastados onde mantem-se provisoriamente protegida – o que significa somente vantagens pontuais.

São milhões de partidos. Polarização de toda ordem. Familiar, profissional, de amizades; as quais se formam a cada dia mais e novas e a todo instante: com exorbitantes vantagens às virtuais.

Encontrar e manter-se em algum tipo de zona de conforto, qualquer que seja que dê ao sobrevivente segurança precária tornou-se uma vergonhosa condição obrigatória. Em um futuro longínquo, é possível que aconteçam alguns estudos apontando que o humano, o animal que desenvolveu as melhores ferramentas de adaptação, tenha que assumir dois pontos maculares fortíssimos fundamentais consolidado em nosso mapa evolutivo que ostentamos com tanto orgulho: que o homem obrigou-se à zonas estéreis onde se sente menos ameaçado não apenas por conta dos caminhos que o conduziram a ela, mas as pesquisas descobrirão também que há um viés psicossocial aí inserido; como nossos ancestrais encontraram soluções para sua sobrevivência sem o tino adequado obviamente, também agora, descobrimos que a melhor forma de nos manter minimamente sociáveis é agarrando-nos ao primeiro tronco que aparecer – confinados às cavernas. Na outra ponta não seria de se admirar que os escrutínios apontassem que o hereditário e perpétuo grupo administrador sabia o tempo todo dessa deficiência e aproveitou-se a exaustão da vantagem secularmente oportuna.     
          
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Alguns poucos homens preocupados e atentos ao desenvolvimento asseveram que nunca o ser humano como indivíduo esteve tão só, ao mesmo tempo em que jamais teve a noção de fazer parte do mundo com tanta força e convicção. Acreditando que pode ser alguém – quando não o é, e está muito longe disso -, que tenha seus valores respeitados. Ter dignidade. Que é livre para gritar por suas vontades e ideologias. No entanto o cordão umbilical com o mundo jamais esteve tão esgarçado. Somente o indivíduo não sabe que está só e mais, em tempo algum esteve tão só.







A socialização vertiginosamente conversora conseguiu arrebanhar o indivíduo em nichos religiosos, nichos imperceptivelmente viciantes que os mantêm aficionados e dependentes. O que algumas percepções alcançam vez por outra e não podem lutar contra é a prisão – de segurança psicológica máxima - a que estão inseridos, mas a condição existencial se fechou a tal ponto que não é possível o grito, o pedido de socorro – se se conjecturasse a mínima intenção. A verdade é que ele nem é expressado; existe uma conivência filial, quase sacralizada, uma espécie de sacerdócio à submissão em todas as instâncias e graus.

Ser humano hoje é não ser, é ser o externo. É ser um vários membros, isto é, fazer parte de algo que ainda chamamos família - ou não, mais cedo do que nunca -, e daí ser, tornar-se membro de inúmeras outras comunidades que nos mantém dentro de um ciclo, uma espiral compreendida e compartilhada por todos como: estes são os nossos tempos; e ainda que não pensemos nisso, pois não se pensa mais em nada fora disso, associa-se com participações coadjuvantes - que assim entende, afinal tudo é formatado para se ser o personagem principal - de amantes de toda ordem a preencher os dias.












Em tempo.: Pá de cal


Grupos alternativos - E sobre a obrigatoriedade de fazer parte de partidos outros, alternativos, descolados, da hora; de filiar-se e se engajar e lutar contra o status quo; grupinhos, grupelhos e suas tribos de revoltados. Não há a mínima possibilidade de se ser um ser só. Então é preciso estar engajado, unido; do contrário você se torna uma espécie de pária, de proscrito, esquisito – então é necessário estar muito bem resolvido para segura essa onda. E enquanto estes autointitulados outsiders descolados - agitadores escolarizados - se revezam, se multiplicam, se associam; não captam que são observados e se demoram a perceber que também eles são permitidos – sua luta é assistida; seu engajamento é monitorado.

Fazer parte de um grupo que se autodenomina amotinados tramps pode ser um estilo de vida, um instante de rebeldia bastante sadio; ou a insistência continuada de se mostrar apenas um teimoso covarde e inconsequente quando invariavelmente se está em verdade optando por fazer parte de mais uma solução anódina lúdica encontrada para também passar os dias.

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Em momento algum estivemos tão só – inclusive, obrigados – e com tanto a nossa disposição para a derradeira e inegociável introspecção, no entanto jamais estivemos tão dispersos, portanto tão longe do auspicioso recolhimento.





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