Constância é também manter-se sereno mesmo que aquele a sua
frente inadvertidamente afirme verdades quando sabemos que o tempo dirá que ele
mente.
“Ator Rei: Acredito, sim, que [tu, atriz rainha] penses o
que dizes agora; mas aquilo que decidimos, não raro violamos. O propósito não
passa de servo da memória, de nascer violento mas fraca validade. E que agora,
como fruta verde, à árvore se agarra, mas, quando amadurecida, despenca sem chacoalho.
Imprescindível é que nos esqueçamos de nos pagar a nós mesmos o que a nós é
devido. Aquilo que a nós mesmos em paixão propomos, a paixão cessando, o
propósito está perdido.”
Shakespeare
“Aquilo que um homem diz, promete e decide na paixão deve
depois sustentar na frieza e na sobriedade – tal exigência é um dos fardos que
mais pesam sobre a humanidade. Ter de reconhecer, por todo o tempo futuro, as
consequências da ira, da vingança inflamada, da devoção entusiasmada – isso
pode suscitar, contra esses sentimentos, uma irritação tanto maior por eles
serem objeto de idolatria, em toda parte e sobretudo pelos artistas. [...] Por
termos jurado fidelidade, talvez até a um ser apenas fictício como um deus, por
termos entregado o coração a um príncipe, a um partido, a uma mulher, a uma
ordem sacerdotal, a um artista, a um pensador, num estado de cega ilusão que
nos pôs encantados e os fez parecer dignos de toda veneração, todo sacrifício –
estamos agora inescapavelmente comprometidos? Não teríamos enganado a nós
mesmos naquela época? Não teria sido uma promessa hipotética, feita sob o
pressuposto (tácito, sem dúvida) de que os seres aos quais nos consagramos eram
realmente os mesmos que apareciam em nossa imaginação? Estamos obrigados a ser
fiéis aos nossos erros, ainda percebendo que com essa fidelidade causamos
prejuízo ao nosso eu superior? – Não, não existe nenhuma lei, nenhuma obrigação
dessa espécie; temos de nos tornar traidores, praticar a infidelidade, sempre
abandonar nossos ideais. Não passamos de um período a outro da vida sem causar
essas dores da traição e sem sofrê-las também.”
Nietzsche
065.k cqe