sábado, 7 de novembro de 2020

Sentidos e significados

 


O sempre admirável Paulo Leminski; viveu a socar nossas caras com enorme maestria. Sob vários aspectos; cagou para o mainstream e, neste exercício de hoje o cito, também como uma homenagem.


Não faz sentido falar de sentido sem um de seus mais surrados - e inegavelmente atual - apontamento; “Sentado não tem sentido”.


Sei o que é sentido e ainda assim assisto todos sentados, ok, brincadeira, apenas uma molecagem desnecessária.




Procurar o sentido da coisa é a energia propulsora de todo o ser vivo - o indivíduo provido de VIDA. Aqui não estou a arrolar o homem que respira. “Ser vivo”, alude ao significado único, inerente ao indivíduo atento; ligado a uma disciplina sã em busca do seu desenvolvimento pessoal.





Meu pai, um alcoólatra, iletrado, foi meu primeiro mestre. Um homem perdido; deslocado e ainda assim integrado, a seu modo, ao agourento buraco em que nos meteu. Até hoje tenho dúvidas sobre suas bebedeiras, porém quero acreditar que vinha também de suas desilusões e de não poder mais integrar-se a paupérrima sociedade pré-estabelecida do lugarejo com a gente – como uma família pertencente. Ah! As importâncias que a vida cria! Morreu como um maldito. Acredito que não o entendíamos, no entanto o velho não tinha preparo para virar o jogo. Mas era bem humorado, criativo, amável e bom. Prestativo, sempre disposto ao ser chamado, embora sabíamos que “gostava de uma rua” – como a mãe conta ainda hoje. Ajudava qualquer um que lhe mostrasse os dentes.



Meu pai, meu primeiro mestre no quesito de desenvolver o meu sentido das coisas. Com ele, apenas observando (calado; ele odiava pitaco furado) aprendi que tudo tem um sentido e a partir de então, foi um pulo para engrenar às palavras, e mais tarde aos relacionamentos.


Aprendi com ele que, calado, não demonstramos nossa total ignorância, e a paciência acaba nos mostrando um caminho para entender sobre o que assistimos.


Após ser inoculado com as cepas do questionar, da curiosidade, inicialmente boba, passando à sã, não me foi mais possível parar um único instante.



Viria descobrir muito mais tarde que somente a busca pode otimizar nossas vidas e nos salvar de uma passagem desperdiçada - aprendi isso com a minha maior inspiração que, providencialmente, é também minha esposa. Mas ela precisa ser incessante, ampla, esgravatada. Da máquina pesada à espátula, daí ao pincel até que a peça surja; possibilitada. E então a procura avança para as salas de escritórios até transcender ao imponderável. Não. Ela jamais termina neste plano limitado à matéria.




Várias pontas soltas jamais farão sentido, e então; desisto? Não. O homem que procura o sentido das coisas jamais estanca; empaca. Nunca. Todo aquele que busca com a vontade nata ou mecânica forjada, entenderá em algum grau, ou passo de todo o processo arduamente apurado, que existem limites ao estado molecular. Em se sendo aberto, amplo, descobre-se que são justamente as pontas soltas as pontes que ligarão suas pesquisas à transcendência. Incansável; retornará vezes em conta a conexões ferozmente tramadas até entender que há uma continuidade e que ela não se dará neste plano de ação. No entanto entende que há tanto ainda aqui a ser explorado que muito do que não pode ser explicado e, portanto, não faz sentido: faz sentido que não faça sentido; isto é transcender.





Há uma historieta, que entendo capciosa que ilustra muito bem as duas faces do querer e do abandonar. De acordo com aquele que busca e aquele que vê sentido em se manter sentado. Ela fala do pescador artesanal que é questionado a se reinventar e progredir. A viver toda uma vida de empreendedor e ao chegar a velhice poder sentar, beber com os amigos e pescar; e então ele responde, “já faço isso agora”.





Finalizo com outra porrada, agora, citando John Lennon, 

“A vida é o que está acontecendo enquanto estamos (sentados) fazendo planos”.



Amor Fati, Nietzsche acertadamente sentiu que precisamos Amar a Vida; tudo o que está acontecendo. Entender o processo tem um significado; aquele que buscar e sentir isso, já transcendeu.


*



A falta de sentido pára o acomodado, mas..., 

como é estimulante para o agente ativo.



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