sábado, 29 de outubro de 2016

Das bodas de Mercúrio... Do respeito













Ela; Minha Sempre Bem Amada, certa vez comentou sobre a simples menção da procura do significado remeter a análise ao nível menor.





“O aspecto da Dialética é, no conjunto, agressivo e ameaçador, e ela profere em voz alta, em tom sacerdotal e divinatório, fórmula incompreensíveis para a maioria: que a afirmativa universal se contrapõe de modo oblíquo à particular negativa, e que ambas são conversíveis; fala também de univocidade e equivocidade e assevera ser a única capaz de distinguir o verdadeiro do falso.”

De nuptiis Mercurii et Philologiae
de Martianum Capellam



 


A Dialética Erística é permissiva, porém jamais perigosa, por se realizar entre membros preparados, contudo, real quando inserida e dissecada em seu meio original. Em seu berço é respeitada como uma estrutura energicamente orgânica: a intrincada Mitologia Antiga; nervosa, carnal, visceral. Pois interessa e se apresenta apenas aos espíritos justos, ou no mínimo, ainda detentores de certa pureza, mas, se reclamada entre indivíduos que não estes: desce ao nível da reles política, da soberba, do vencer a qualquer custo, se não prestes, passível de cometer o pior dos erros, jamais permitido na dialética séria: o desrespeito antes, durante ou, e principalmente, depois do embate confirmar a derrota do adversário. Se existissem regras apontadas seria a primeira, como não há, o espírito da ética, ainda existente apenas entre os seres compromissados, deve seguir margeando os competidores no sentido de singular escolha simplesmente porque estes fazem parte de uma casta que tem como único intuito o debate saudável (disputatione). Aos olhos de hoje, se fossem ainda possíveis, mais a um entretenimento aristocrático, algo próximo ao xadrez, a bem dizer, ou melhor; para alguma compreensão em tempos de desconforto intelectual, os debates voltados a esta linha de ação podem muito bem ser considerados o xadrez da dialética no que se refere ao não enfrentamento agressivo. Os enxadristas combatem antes lutando contra si próprios. Concentrados, os defensores dos míticos combates erísticos estão sempre voltados também as suas representações argumentativas suplantando as possíveis estratégias adversárias, ainda que delas – em se tratando de bons combatentes – não se descuidam um único instante.

*


Trabalharemos essa que é mais, uma homenagem à arte da Escrita e da Dialética e aos seus autores póstumos. Buscando na intenção, laurear principalmente seus Avatares a partir da emblemática história apontada n´As bodas de Mercúrio e Filologia, texto latino do século V d.c., do retor norte-africano, Martianum Capellam.

Somente faremos referência aqui a parte da clássica “de nuptiis...”, que foi publicada junto ao pequeno compêndio “A arte de ter razão”. Reunião de manuscritos que conferem 38 apontamentos sobre a dialética do debate de Arthur Schopenhauer, que fora exposto, - ao menos a parte inicial - em Parerga e Paralipomena (o filósofo alemão jamais publicou as pequenas anotações).

Afora as datações oficiais sobre quando se deu início as batalhas verbais, mais ou menos no ano 500 a.c. Respeitáveis perscrutações a fragmentos de hieroglyphos tecnologicamente datados fazem referências a possíveis batalhas voltadas a logicae, (por muitos confundida e por outros tantos defendida como sinônimo de dialética) séculos antes; quando os escolhidos dos burgus representavam suas autoridades máximas, simplesmente pelo prazer da dissertatio.


Porque Schopenhauer não publicou estes, que nos parece mais: uma forma de mostrar ao homem quão abjeto pode ser em busca da sua vitória egoísta ao fugir da Dialética propriamente dita e voltar-se ao ensimesmismo ordinário, comum e que a tudo corrói; é possível que tenhamos uma boa ideia ao deduzir do próprio filósofo, por conta de uma declaração carregada de palavras ácidas, ao se referir a sua compilação: “...pôr-me agora a ilustrar todas essas escapatórias da limitação e da incapacidade, irmãs da obtusidade, da vaidade e da desonestidade, causa-me náuseas; por isso detenho-me nestes ensaios e ressalto com energia maior as razões alegadas acima, para que se evite discussões com pessoas como quase todos são”.


II - Das bodas de Mercúrio... Alusão



Bandeiras típicas da idade média se agitavam com os ventos vindos do mar. Algumas entre variados estilos orientais e distintos modelos indo-europeias e norte-africanas entre outras com seus brasões ricamente taxados com as alegorias representativas aos locais de origem. Simbologias ancestrais que carregavam em suas símiles, as mais variadas referências. De morcegos a falcões; de coelhos a imponentes tigres, porém que não se engane. Todos os afiliados traziam na ponta da língua a digna representação de cada um deles, a tal ponto que não era possível defender o que a olhos vistos, sempre venceriam, após serem conceituados seus devidos e valorosos dotes que lhes concedeu a honra de figurar junto ao selo de reis ilustres e imbatíveis imperadores. No desfile dos pavilhões também podia ser conferida, somadas as figuras anteriores, a representação das mais inusitadas armas onde as espadas sobressaiam-se; cruzadas, empunhadas, juntas e separadas. Homenageando tanto as vitórias do reino quando suas somas aludindo às derrotas provocadas. Grafias quase imateriais em árabe ou ideogramas orientais representando culturas ancestrais do clã e respectiva região. Todos orgulhosamente prostrados em silêncio, eretos, doutrinadamente empostados, antecedendo a primeira fala do representante mor, vencedor da última batalha; o único som possível a ser ouvido era causado pela passagem da brisa marinha por entre centenas de bandeiras.

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III - Das bodas de Mercúrio... Um Filósofo e sua paixão



Em outro tempo, um filósofo alemão de nome Arthur Schopenhauer trabalhava o que chamaria de “Dialética Erística”, com a mais perfeita consciência crítica também de, inicialmente, nomear, e trazer a tona as batalhas épicas de eruditos palestrantes. Situar ao seu “agora” o embate, os famosos debates (disputatio sollemnis publica), contextualizando-os, para uma dezena de alunos sob seu comando.

Pesquisador nato, filólogo de nascença, não media esforços, buscando deixar um legado sério para uma discussão que, ainda que respeitadíssima e avalizada principalmente por Platão tanto em textos como nas famosas reuniões comensais ou não, carregava a energia do histórico, de muito além e de novas nomenclaturas, derivações e definições como do Antigo Mediterrâneo por exemplo. Um tempo secular anterior aos icônicos gregos pré-socráticos, havia carregado o processo que agora Schopenhauer tentava traduzir para o seu estado contemporâneo. E, por conta dessa força, consciente da responsabilidade, sem nem mesmo, ou, tão pouco conjeturar quanto mais existiria que não figurava nos compêndios e hieróglifos que lhes chegaram às mãos, fazia o possível para não macular seu inigualável currículo, justamente em um tema que lhe era tão caro a ponto de sofrer com a imaginação, caso falhasse: da continuação da história execrá-lo por conta de tamanha ousadia. Um sábio; entendia a dificuldade de postular entre teses e ferrenhas defesas cuja mitologia erigida em densas representações, aludia ao não tornado em si.


Parte do que se pode ter acesso hoje, não por qualquer um, diz respeito à honra dada ao personagem que se destaca na Dialética, e, desde sempre, a “Erística” como iremos definir aqui, mais uma homenagem a parte ao Grande Schopenhauer, afinal ele fez história, e jamais um combate filológico que preste se permitiu a partir de então sem prestar a justa reverência a este que também figura no Panteão da Dialética; vem causando debates extra campo, rigorosos a ponto de fazer frente às discussões oficializadas de vitória ou derrota dos jogos reais em nome da Dialética, secularmente praticado. 

IV - Das bodas de Mercúrio... Esmaecendo










Bastante apagada do nosso tempo tecnológico, em dias encurtados justamente quando todas as ações humanas receberam instrumentos e avanços para agilizar os processos cotidianos; a razão, a lógica, a dialética, tanto seus históricos quanto sua continuidade perderam terreno na medida que, de maneira proporcionalmente inversa, a busca do espaço para que a humanidade ganhasse tempo, delas tomasse. Existem hoje dois caminhos completamente antagônicos na faculdade da escrita: aquele voltado à arte e o comercial; onde o primeiro jamais voltará à posição um dia ocupada.


Neste exercício que teve sua formatação a partir das anotações de Arthur Schopenhauer que resultou em um pequeno volume comercial – posterior a sua morte - chamado A arte de ter razão; sensações foram despertadas para as energias; os ares que envolveram todo este espaço/tempo que chamamos de "Passado da Escrita", tendo então a vontade despertada de resgatar, dada a pretensão natural surgida da leitura, somada à prepotência que o próprio filósofo insiste em afirmar ser uma dominante do homem; narrar amarrando, em pensamento atual, o que veio sendo dito desde então sobre o assunto costurado no compêndio, nos moldes apropriados à epígrafe ou buscando preservar o contexto das próprias anotações, evocando o que Schopenhauer denominou como Dialética Erística.


V - Das bodas de Mercúrio... Colunata




Retomada as convocações para as disputatione dialecticae quadrienal, o Corpus Dialecticum representado por sua autoridade máxima O Grão Mestre do logus aetermun; os concorrentes (opponens disputantes) deveriam, após as qualificações de praxe, enviar um manuscrito de próprio punho evidenciando assuntos concernentes, diletantemente costurados entre os seculares ícones que construíram o que de mais rico nos dá o passado, e, cujos nomes, agora caracterizados em autoridades reais, todos, se possível fosse, ilustres figurantes das Colunas do Areópago, aos qual foram erigidos portentosos obeliscos rascunhados ao longo da história. Sabe-se que os maiores, os mais representativos textos já escritos na Antiguidade eram cunhados em colossais monólitos de pedra - nem sempre no tamanho, mas no texto; indiscutivelmente sempre este superará em imponência qualquer homenagem que o represente - para que ficassem eternizados como orgulho maior da arte mais nobre que sempre existiu; a Arte das Letras. E assim se deu.


VI - Das bodas de Mercúrio... Meá culpa



Lançando mão da humildade que a nós queremos rogar, por conta da impossibilidade do gênero, sem fugir da prepotência normal e desconhecida ao sempre impaciente entusiasta e tornada instrumento de posse arrasadora ao ladino que conhece e respeita ainda que se aproveite também da conexão natureza e esperteza humana. Este texto não busca demolir coisa alguma, muito menos construir novos adendos ao secular cânone edificado; pronto e exato. Mesmo porque todo o expectador tornado homem da ciência didática lógica possui sabedoria suficiente a disposição de tal domínio. Principalmente por entender que o mendigar atenção é falta pré-eliminatória a qualquer demanda séria, tanto quanto regatear ou desrespeitar, ao brincar com expressões que a nada levam a não ser a digressão vaziamente floreada, tipificada a quem pouco sabe, ou seja, tendo em mente, sempre prestar o reverência devida a referência do icônico vórtice energético constituído da erudição em torno de nomes e histórias agregadas ao plano/organismo há tanto definitivamente instalado.

Permanecerá para sempre aqui traçado juntamente com a importância deste processo de contenda que antes: norteará, evidentemente, a reputação do dito, desde a história Antiga a Idade Média, de Sócrates a Schopenhauer, de Zenão de Eleia a Teofrasto; a necessidade que carrega e que fez com que a Dialética aflorasse acima de todas as artes, até merecidamente volitar sobre a alcunha de fonte do saber científico “profundae fons decens scientiae” como proferiu divinamente Palas no “De nuptiis”; menos por insistirem ao longo de toda uma existência de manifestações no fato de também constituir-se uma usina geradora de enigmas, e mais por sua força nata, construída por conta não apenas sua, mas por superlativas gestações ininterruptas, vindas à luz após o contato com clássicos homens de pensamentos e ações. O que é certo e o que é errado, o que é verdadeiro e o que é falso, o que é necessário e o que é inexato quando se põem em marcha nova pesquisa a este respeito!

Se por um instante é depositada toda a fé e entendimento em detrimento de determinado aforismo, no seguinte, a certeza de outro que o refuta faz cair por terra toda uma defesa ilibada que até então se creditava por si só ou por conta do autor de inegociável beleza argumentativa ao causar o mesmo furor entusiasta tanto ao dizer quanto ao desdizer acertadas orações, agora, peremptoriamente questionáveis.

E assim persistirá para todo o sempre, afinal este é o espírito, a alma, o em si da Dialética. E aquele que ainda não percebeu que a magia ou que a mágica está representada justamente no espírito que comanda este embate, buscando decifrar ou delinear argumentações que releguem todos os paradigmas até então alinhados como mentirosos ou possuidores de uma verdade inventada, não apenas não sabe jogar o jogo sério envolvendo doxa ou endoxa, como é justo, não deva este participar de comissão alguma onde o preceito máximo do respeito, ou a premissa irrevogável da certeza no incerto é o que movimenta todo o processo dialético criativo.

Comprovadamente a Dialética tornou-se um corpo único, com identidade independente, portanto, é difícil nomear sua extensão tentacular. Por conta de toda essa configurada envergadura; assumida a partir de energias a nós desconhecidas, geradas em seu entorno. Deve-se considerar, afora vãs convenções, que a elipse garantida daí; da imensurável aura herdada desse inegável complexo existencial; ou melhor, é-nos, permitido afirmar, que isto foi construído observado por certo grau de importância não apenas do em si dialético, mas aqui, contrariamente a tantos que tentam derrotar ou eliminar o que malgradamente entendem como negativo, que acabam estes, não fazendo parte da elite dos dialéticos - ainda que de alguma maneira o são -, até porque eles precisam existir, ou convencerem-se, quanto então, obrigatoriamente e inequivocamente somam junto a tantos outros que defendem todo este incontestável legado ricamente estabelecido exatamente como conhecem e respeitam aqueles que o sabem – afinal tudo é muito maior que qualquer colegiado arredio a inatacável certeza. Nunca é demais expor que foi da desimportância, de hoje tornados respeitáveis detratores, superada em muito por importantes defensores seculares e até epistolares eruditos que construíram; cercado de particular simbologia, um Monólito Sagrado intocável, que compreende não de agora, todo o cabedal filológico linguista deste período que contém fácil: uma dezena de milhares de anos – apenas no tempo conhecido -; o conjunto formador do colosso designado Dialética.


Investir em defender qualquer tese a favor de uma peça de densidade inegociável não é tarefa fácil quanto é de extrema responsabilidade. A Escrita é a verdadeira representante da pura democracia original. Em assim sendo, ao deparar-se com esta terra de abundância e liberdade de significados, todos, ainda que o pior dos analfabetos: pode dissertar sobre o que entende que entende, e em qualquer momento da existência do indivíduo é possível que se depare com a necessidade de fazê-lo em situações de defesa ou ataque. E ainda que tenha ele que enfrentar alguém de técnica verdadeiramente argumentativa é certo que o espaço aberto a partir da disputa jamais deixará de levar em consideração as diferenças envolvidas, pretensões, necessidades e veracidades que nortearam o culminar do embate, e por mais que um apurado profissional da retórica venha a florear palavras experimentadas durante anos de exercícios, a diferença não apenas é levada em consideração quanto mais (é) a pureza e a vontade de cada um defender-se e atacar.


VII - Das bodas de Mercúrio... O em si



A coisa é o em si, ou seja, tratar a Dialética, ou melhor, desmerecê-la rebaixando-a a arte do convencimento é deixar de entender a lei máxima que rege todo o processo de causa e efeito.

A ação é porque nasceu; acontece a todo o vórtice que será formado e aos poucos irá agigantar o portentoso processo que não mais cabe a nós humanos medi-lo com nossas limitadas críticas. A peça far-se-á por si só. Não há a mínima possibilidade de regrá-la a partir do momento que não depende mais de instrumentos materiais, os únicos a nós disponíveis; capaz de mudar algo.


A Dialética, portanto, é agora, e assim sempre foi; por si só. Poderemos continuar, por toda uma eternidade, ainda a nós imprevisível, abrindo discussão a este respeito. Para sorte dos Deuses da Escrita somos hoje menos ocupados a aborrece-los com coxas contendas, - lançando mão desta nossa herança que insistimos em não desmontar - dado nossos desvios à ações mais “interessantes”. Trate-se ela de defender o falso em nome do verdadeiro ou de lançar dúvidas sobre o que é defendido como verdade, não cabe a nós este absurdo. Nossos valores; nossas referências são ínfimas: próximo de um estado que muito mais transcendeu a nós do que podemos ter a prepotência de entendermo-nos seus senhores.


VIII - Das bodas de Mercúrio... Legado


Qualquer pesquisa voltada a dialética dos antigos receberá com estrema graça, informações totalmente consolidadas já postas, por conta de incontáveis estudos dos mais respeitáveis aí demandados. Nomes como Heródoto, Isócrates em seu Areopagítico, se bem estudados já degenera o descrito anterior da faculdade do falar por falar, embora alguns estudiosos discordem, é natural, esta versão. Os famosos discursos de Platão no Górgias mais conclama à liberdade da palavra; cabe aqui um famoso aforismo ainda não datado ou autorado “Não me importa se ele me é um falso, se me é fiel”, ou seja, a natureza do indivíduo precisa ser espeitada; o mais importante é que ele cumpra o prometido, a forma como ele fará isso não.


Em Homero já se atesta o verbo, porém é em Platão que ele adquire uma acepção claramente filosófica, embora algumas escolas contestem refutando e defendendo a existência, ou seja, a consciência e a clareza do verbo, anterior a estas defesas. Teólogos mais ortodoxos insistem que mesmo o famoso “Verbo” da clássica “In principio erat Verbum” é a verdadeira origem do verbo e este já existia antes mesmo da concepção material do B'reisheet.

IX - Das bodas de Mercúrio... Sócrates



Como designar a proporção da petulância humana ao tentar brincar com tamanho gigantismo! Não é possível defender ou afrontar uma condição forjada que aparentemente indique prematuramente estar fora dos padrões humanos; assumindo a assertiva de Platão; “o homem é medida de todas as coisas”. E porque a natureza não encontra par para afrontá-la entremeado no universo conhecido – seria um descalabro se não fosse lembrado aqui da obviedade desta versão. Portanto, se o nascimento de uma ação deve ser entendido como tendo obrigatoriamente sua permissão, também toda a ação nascida torna-se uma obra filha da própria; nata; legítima. A diferença se dá correlativamente com as ações perniciosas ou não. Invariavelmente as primeiras tem um reinado análogo à necessidade da força maior, diferente das demais que são consentidas como filhas da natureza e então defendidas não apenas entre nós, neste caso, vestidas com a roupagem do universo incontido, ou seja, passível de serem eternizadas.

Sócrates; considerado também, pai-fundador da Dialética; outra oportuna, nada mais grassando além de uma justa e merecida honraria - sempre menores a reverenciar seu histórico - ao último dos originais, conceituados naturais; aqueles que filosofaram para o nada, sem pretensão; sufísticos. Eram conduzidos por suas inteligências natas e da sua pureza cotidiana frugal não insistiam, apenas parlavam. Assim como é justo fazer uma referência aos três neste mesmo parágrafo; Platão, Aristóteles[1] e Senofonte; sobretudo que os últimos dois ensinaram utilizando-se do método dialético difundido por Protágoras, reafirmando, ou melhor, impulsionando a natureza clara da Dialética, confessadamente, amiga simpática de Sócrates.

O divisor de águas da filosofia, Sócrates, já alinhavava a tese de que a natureza é conveniente ao seu em si, e diferente de Protágoras, nosso Mestre Maior da filosofia dissuade a todos de que a dialética é proprietária de um saber estável como a ciência. Não concordando que todas as opiniões devem ser classificadas em refutáveis e não refutáveis, uma vez que se mantém convicto a opinião de que é favorável a asserção de a dialética ter uma tarefa análoga a retórica; não precisa ela persuadir ou dissuadir em relação uma a outra independentemente da verdade. Em suma, não é possível defender que todas as opiniões são verdadeiras, mas o contrário, parte do princípio que todas são inicialmente falsas. E isto é próprio da natureza gaia de seu ser; daquele que com inteligência prefere viver entre todos e ali aprende a se defender. Aqui então se encaixa, ou melhor, por conta de defesas como esta que não se encaixa o que Sócrates refuta como “caráter de saber estável”; mas não podemos deixar de lado nesta passagem a justa afirmação atribuída a Protágoras, “Sobre qualquer argumento é possível sustentar opiniões opostas”.

Ora, Sócrates tem a Dialética como o Cânon, uma régua; “a tarefa da Dialética passa a ser uma tarefa crítica” p85; ou seja, não deve ser ela posta a prova sobre opinião alguma, mas ao contrário, é a partir dela; de sua densidade inquestionável, que advirá o resto.

Eufemisticamente falando, afinal nada mais justo que ponderar palavras em meio a energias tão díspares quanto evidentes; ao fim de todos os estudos a dialética assume o que é: uma camaleoa disfarça no discurso dos opostos, em evanescentes nuances de verdadeiro e falso – no De nuptiis, Brômio ou Dionisio-Baco tenta agredi-la, alfinetando-a com um: “bruxa charlatona”. Os sofistas a defendem como de seus domínios, os lógicos nem refutam sua não propriedade, enquanto escolas neutras avançam para os sempre ponderados silogismos, e erísticos engajados sustentando a vitória a qualquer custo a tem como sua; no entanto a maior prova da soberana riqueza de entendimento, de clareza, de lucidez, pertence a Sócrates. Que a defende como proprietária única – como não poderia deixar de ser - de seu em si.




[1] em tempo; importante lembrar o que diz Kant no prefácio da segunda edição de Crítica da razão pura, no mais digno respeito e referência a Aristóteles sobre a lógica; “de Aristóteles em diante, não teve de dar nenhum passo para trás, tão pouco pôde dar algum passo para frente”.





X - Das bodas de Mercúrio... O não que é sim... do não que não é não



Contradição, refutação, falso, oposto; é injusto que palavras de raízes negativas estejam sempre alinhadas as dialéticaes disputation? Não. E este “não” é proposital. Uma negação a mais com razões extremamente positivas. Já foi provado que a Dialética tem o endosso da Natureza, portanto, sendo os envolvidos partidários da lógica da Irmandade Pura, nada pode ser negativo, nem mesmo falácias (ignominiun). Tudo é uma forma embrionária de evolução; da evolução que não cessa. Inventio e iudicium; a invenção da verdade; quem pode negar-se a ela em um universo totalmente desconhecido ilusoriamente subjetivado sob claras e capciosas nuances! Aludir ao fictício é arte. Paralogismos apodícticos podem conviver em harmonia? Sim e não; quem sabe? A manifestação silogística humana dá provas da originalidade e criatividade do homem para a construção de aforismos, inflamados colóquios, histórias, contos e todas as demais ficções criativas inclusive o que podemos entender por erísticos falsos. Defender endoxa ou a fallacia extra dictionis como estratagemas de vitória, refuta a mais séria das controvérsias porque, se partissem da pressuposição da verdade, qualquer asserção não é mero retorismo; o que nos leva a crer na possibilidade da verdade inventada, porém, jamais mentirosa.

XI - Das bodas de Mercúrio... A Mitologia



As bodas de Mercúrio e Filologia

História de maior expressão e de fundamental importância na mediação entre a cultura pagã da Antiguidade tardia e a incipiente cultura do Ocidente cristão, Marciano Capela traz este texto escrito de forma literária mista de versos e prosa conforme tradição da sátira menipéia, retirado aqui do livro A arte de ter razão de Arthur Schopenhauer, dando conta de que a cultura cristã afortunadamente o acolheu por toda a Idade Média. “Trata do De nuptiis Mercurii et Philologiae, em que encontramos, no limiar da nossa era, uma exposição representativa da dialética e, portanto, um testemunho significativo da transmissão do corupus dialecticum da Antiguidade tardia ao Ocidente latino.”  E segue no livro p75:

Os deuses do Olimpo, narra Marciano Capela, preocupavam-se com o fato de que Mercúrio, deus da linguagem e da palavra, ainda não havia encontrado uma esposa adequada. Para pôr fim ao seu duradouro celibato, arranjaram para ele se casar com uma virgem mortal, Filologia, Símbolo do amor pelo logos, a qual, depois da união com Mercúrio, foi recebida entre os imortais. A cerimônia nupcial se dá em presença das divindades olímpicas, reunidas em torno de Júpiter. A noiva chega acompanhada de sete damas de honra, que personificam as sete artes liberais: as três do discurso, isto é, gramática, dialética e retórica (o trivium), e as quatro do número, isto é, geometria, aritmética, astronomia e música (o quadrivium). Cada uma das sete damas de honra expõe os conteúdos do saber que representa e, no fim das bodas, será consagrada a união do infinito poder da linguagem com sua manifestação num saber cientificamente ordenado.

Para nós, é interessante o comparecimento, no quarto livro da obra, da Dialética, personificada por uma dama de honra que avança em segundo lugar, logo atrás da Gramática. Marciano Capela descreve cuidadosamente sua aparência, seu porte e seus atributos. Tem o resto pálido, mas seu olhar é inquieto e penetrante; seus cabelos, densos mas ordenadamente trançados, adornam sua cabeça de modo acurado e completo; usa a túnica e o pálio de Atenas e traz nas mãos os símbolos do seu poder: na esquerda, uma serpente enrolada em enormes espiras e, na direita, plaquetas com esplêndidas e coloridas ilustrações, presas por um gancho oculto; e, enquanto a esquerda esconde sob o pálio suas insídias viperinas, a direita é a todos exibida. O aspecto da Dialética é, no conjunto, agressivo e ameaçador, e ela profere em voz alta, em tom sacerdotal e divinatório, fórmula incompreensíveis para a maioria: que a afirmativa universal se contrapõe de modo oblíquo à particular negativa, e que ambas são conversíveis; fala também de univocidade e equivocidade e assevera ser a única capaz de distinguir o verdadeiro do falso.

Uma entrada em cena cheia de tensão, que causa certo mal-estar nos deuses, mas que Brômio, isto é, o “barulhento” Dionisio-Baco, desdramatiza, observando o quanto a recém-chegada se parece com uma bruxa charlatona, que provoca, entre os espectadores, certa hilariedade. Mas a deusa Palas, que conhece bem a Dialética, intervém para dizer que ela não é personagem de quem se possa zombar, como se verá assim que ela expuser em latim o seu saber. A dialética declara em exórdio ter origens gregas, mas que poderia expressar-se igualmente em latim graças ao precioso trabalho de mediação levado a cabo por Varrão, o primeiro a traduzir seus ensinamentos na língua dos romanos, depois de aprendê-los nos textos de Platão e de Aristóteles. No entanto, seu nome, Dialética, manteve-se em grego, permanecendo igual em Atenas e em Roma. A Dialética começa então a expor seu ensinamento, que compreende, de acordo com a ordem em uso nas escolas gregas, retomada por Varrão, todo o corpus de doutrinas da lógica clássica, articulado do seguinte modo:

1)   De loquendo, isto é, a doutrina do significado dos termos, que compreende os cinco predicáveis (gênero, espécie, definição, próprio, acidente), os antepraedicamenta ou instrumenta categoriarum )isto é, a distinção de diversos ritos de denominação: equívoca, unívoca, plurívoca, própria, alheia), as categorias (substância, quantidade, qualidade, relação, espaço, tempo, fazer sofrer, estado, hábito), os post-praedicamenta (isto é, as quatro formas de oposição: contradição, privação, contrariedade, relatividade), a definição e a divisão;

2)   De eloquendo, isto é, a doutrina do discurso e das suas partes (nomen e verbum, que formam a oratio);

3)   De proloquendo, que compreende a doutrina da proposição predicativa ou juízo (proloquium), que, como síntese ou diairese de representações, tem a característica de poder ser verdadeiro ou falso, as differentiae proloquiorum (ou seja, a qualidade afirmativa ou negativa e a quantidade universal ou particular dos juízos), o proloquiorum affectiones e a conversão das proposições;

4)   De proloquiorum summa, vale dizer, a doutrina do silogismo como concatenação de proposições e as suas diversas formas (categórico, hipotético e misto)
Depois da exposição desses seus ensinamentos, a Dialética se apresta a continuar com a ilustração da doutrina dos sofismas, dos raciocínios capciosos, das falácias e dos enganos que é possível perpetrar por meio da palavra, argumentos tratados nas Refutações sofísticas de Aristóteles.  Mas aqui intervém Palas, que interrompe a Dialética, não apenas para não cansar o auditório, mas também porque a exposição dos enganos sofísticos não convêm diante de Júpiter e das outras divindades. Diz então Palas, dirigindo-se à Dialética para interrompê-la: “Já chega, ó nobre fonte da ciência profunda (profundae fons decens scientiae), que desvela as realidades ocultas, dissertando sem omitir nada que seja pouco claro nem abandonando nada que seja ignoto.”

No que concerne à nossa história, dois pontos desse texto devem ser postos em evidência. O primeiro é que a dialética é considerada apropria fonte do saber científico (fons scientiae) e é tendencialmente identificada com a lógica, entendida como o conjunto das regras do raciocínio e da argumentação corretos, destinadas a discernir o verdadeiro do falso. O outro é que a dialética, justamente por sua natureza de fonte do saber, é separada com rigor da sofística e da erística, que do saber só têm a aparência.

         A presença dessa ideia de dialética entre o final do mundo antigo e o início da nossa era, documentada de forma tão plástica pelo De nuptiis, é posteriormente confirmada por outros textos muito difundidos na Idade Media, em que é possível reencontrá-la, como as Institutiones de Aurélio Cassiodoro, as Etymologiae de Isidoro de Sevilha ou o De dialectica de Alcuíno. Podemos recordar também o De dialectica (ou Principia dialecticae), obra bastante difundida, de autenticidade duvidosa, mas talvez de santo Agostinho, que define a dialética como a disciplina disciplinarum ou a scientia veritatis.

         Temos, portanto, na transição do mundo antigo ao mundo da “idade mediana”, uma ideia decididamente positiva da dialética, entendida como fonte de ciência, que não deixa de surpreender, depois de se ler o texto de Schopenhauer. Perguntamo-nos: como tudo isso foi acontecer? Como se chegou a ver na dialética a fonte da ciência? 

*

Particularmente, ao perceber a força envolta em renomadas opiniões historicamente oficializadas que consagram à Dialética as mais elevadas referências, é nosso dever defender que, analogamente, ela seria a síntese da existência observável. Onde cada qual crê firmemente em uma verdade inventada; “o mito nosso de cada vida”.


Pode que a dialética dos deuses ou dos grandes gênios trafegue no que nós simples mortais entendemos por verdade ou mentira com importância descuidadamente diferenciada (por que deveriam eles escusas; evasivas ou não?); por conta da obviedade natural - há tempos preterida ao próprio estado instalado por assumido descompromisso -, e sempre imatura. Conquanto, esses tentam decifrar o que aqueles não veem motivo sequer de abrir discussão. Talvez nos falte perceber que os homens que detém as chaves da nata ou artificialmente criada sabedoria, não têm relação apenas com a matéria palpável por estarem eles, credenciados à transcendência.


sábado, 22 de outubro de 2016

Enquanto isso; há muitas eras


Quando certo governante perguntou a ele como se poderia instilar reverência, dedicação e entusiasmo ao povo, 
Confúcio disse:

“Governe-o com dignidade que haverá reverência, trate-o com bondade que haverá dedicação; promova os bons e instrua os incompetentes que se promoverá entusiasmo”.

Trecho do livro; Confúcio e o mundo que ele criou
De Michael Schuman




008.M cqe

Animalidade civilizada


Se é verdadeiro o que afirmam alguns sábios ao decretar que o homem nasce livre e permite que sua natureza animal se manifeste e então perece envolto de suas ânsias atrozes e retorna para expiar e assim novamente tudo ocorre de novo e de novo; por que deveríamos apostar que estamos evoluindo!?! – aonde se dá o equilíbrio desta equação!


007.M cqe

Por que deveria!










Não faço questão disse-me ele; sobre sua não atenção a alguém hierarquicamente inferior.





“Agastados, só se dirigem a nós corroídos entre ódios gratuitamente inventados em duas situações: por conta de suas solicitações incessantes, ou com alguma sugestão que; quando presta, ao se retirarem, acreditam ter-nos tornado seus eternos reféns, por não haver entre nós a mesma noção de acordo de grupo – comprometimento natural a toda hierarquia elevada”.

Em parte concordei; entendendo nossa parcela de culpa.


006.M cqe

Luta inglória

















Bato contra um rochedo
que não passa de um amontoado de lodo.





005.M cqe 

sábado, 15 de outubro de 2016

Maturação e coragem













Dos invisíveis monstros
que carregamos




O homem ruma ao abissal universo material 
para não encontrar 
o que realmente deveria lhe interessar; 
Sua Verdade.



004.L cqe

Vão ir



No roçar diário eles se suportam
Aceitam pequenos deslizes uns dos outros
Perdoam-se mutuamente pequenas faltas
Quando maiores, 
Desculpam-se em mentiras compassivas
Assim arrastam-se nos alçapões do tempo
Hoje esquece, amanhã cobra
Não é mentira não é verdade este é o nosso ir


Da série; 1brown masmilalmasmilalmas...
003.M cqe



PS. Aviso aos desavisados, este título não deve ser utilizado como inspiração para nomear qualquer infeliz que seja.

Maus tratos



O que não sente o inocente!


002.M cqe