Êxito - Nada é mais
humilhante do que ver os tolos vencer naquilo em que fracassamos.
Felicidade - Ser
estúpido, egoísta e ter boa saúde, eis as condições ideais para se ser feliz.
Mas se a primeira vos falta, tudo está perdido.
Gratidão - Aos
incapazes de gratidão nunca faltam pretextos para não a ter.
Crítica de Arte - Faz-se
crítica quando não se pode fazer arte, como quem se torna delator quando não se
pode ser soldado.
Estilo Literário - O
estilo está sob as palavras como dentro delas. É igualmente a alma e a carne de
uma obra.
*
O Fim da Civilização
Quando se extinguirá esta sociedade corrompida por todas as
devassidões, devassidões de espírito, de corpo e de alma? Quando morrer esse
vampiro mentiroso e hipócrita a que se chama civilização, haverá sem dúvida
alegria sobre a terra; abandonar-se-á o manto real, o ceptro, os diamantes, o
palácio em ruínas, a cidade a desmoronar-se, para se ir ao encontro da égua e
da loba.
Depois de ter passado a vida nos palácios e gasto os pés nas
lajes das grandes cidades, o homem irá morrer nos bosques. A terra estará
ressequida pelos incêndios que a devastaram e coberta pela poeira dos combates;
o sopro da desolação que passou sobre os homens terá passado sobre ela e só
dará frutos amargos e rosas com espinhos, e as raças extinguir-se-ão no berço,
como as plantas fustigadas pelos ventos, que morrem antes de ter florido.
Porque tudo tem de acabar e a terra, de tanto ser pisada,
tem de gastar-se; porque a imensidão deve acabar por cansar-se desse grão de
poeira que faz tanto alarido e perturba a majestade do nada. De tanto passar de
mãos e de corromper, o outro esgotar-se-á; este vapor de sangue abrandará, o palácio
desmoronar-se-á sob o peso das riquezas que oculta, a orgia cessará e nós
despertaremos.
Então, quando os homens virem esse vazio, quando se tiver de
deixar a vida pela morte, pela morte que come, que tem sempre fome, haverá um
riso imenso de desespero. E tudo explodirá para se desmoronar do nada, e o
homem virtuoso amaldiçoará a sua virtude e o vício aplaudirá.
Alguns homens ainda errantes numa terra árida chamar-se-ão;
encontrar-se-ão e recuarão horrorizados, aterrorizados consigo próprios, e
morrerão. O que será então o homem, ele que já é mais feroz do que os animais
ferozes, e mais vil do que os répteis? Adeus para sempre, carros deslumbrantes,
fanfarras e famas; adeus, mundo, palácios, mausoléus, volúpias do crime e
delícias da corrupção! A pedra cairá de repente, esmagada por si mesma, e a
erva crescerá sobre ela. E os palácios, os templos, as pirâmides, as colunas,
mausoléu do rei, caixão do pobre, carcaça do cão, tudo isso ficará à mesma
altura, sob a relva da terra.
Então, o mar sem diques baterá tranquilamente nas praias e
irá banhar as suas ondas na cinza ainda fumegante das cidades; as árvores
crescerão, reverdescerão, e não haverá mão que as quebre e as destrua; os rios
correrão nos prados floridos, a natureza será livre, sem homem que a oprima, e
esta raça será extinta, porque era maldita desde a infância.
Gustave Flaubert; Memória
de um Louco
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