sábado, 5 de maio de 2018

Um Marx, vários marxismos





Sinônimos antagônicos - Do gênio eterno e sua genialidade fisiologicamente contextualizante.

No livro Em busca dos fundamentos perdidos, de Edgar Morin, me deparo novamente com um pensamento inteligente por tratar-se apropriado, sensato e imparcial apartidário concentrando-se tão somente na pureza da proposta, no entanto assisto pela primeira vez tudo isso reunido referindo-se ao inimitável – ou seria intocável? - Marx. Conseguindo, magnificamente, se aproximar da crueza da proposta deste mantendo-se livre de dogmas ao passar de forma genial ao leitor a ideia real do nosso ilusório coabitar social político corrente sem recorrer aos costumeiros artifícios do empirismo malhado, da metafísica ou dogmas aferrados escancarando, simultaneamente: o quanto estamos encalhados no anti-marxismo como o concebemos ainda puro e petrificado – não o político manipulável, mas o fisiológico. No entanto não é só; o pensador francês aprofunda sua síntese sem que, em momento algum derrape nos clichês óbvios do que se transformou o marxismo barato e partidariamente engajado – uma análise totalmente isenta que instiga à contextualização verdadeira e inteligente, pares reais de um gênio até então empalhado para todos aqueles que aderiram a panfletagem partidarista que, obrigatoriamente, busca arrastar as massas, ou a elite intelectual preguiçosa por conta da morbidez acadêmico catedrática ou da engajada trupe a que pertence o torpe pensador popularista; extremamente oposto ao nosso, a meu ver, ícone maior do pensamento contemporâneo.

O que Edgar Morin nos apresenta é um retrato social/político escroto e abjeto – aberto e enraizado voltado à separatividade -, e como sempre – é o papel do pensador filosófico, fazê-lo – escancarando, e, no entanto, se expondo ao apontar, ao deixar claro que não há nada que possa ser feito. Ele até, magnificamente, assinala pontos de abordagem ao deixar claro para o entendimento comum, lançando mão da expressão emprestada do alemão, Sollen (dever-ser), realçando o que insistimos esconder: que estamos todos fadados a viver no absurdo que o sistema atual nos apresenta; com o surrado: é o que temos para hoje, nas suas palavras, talentosamente transformado em - “só pode ser assim e, contudo, deve ser de outra forma”.



 



Da série; descerrando o véu

É papel do autor filosófico tão somente startar uma ideia; é o subsequente conjunto em movimento que se aproveita do sempre evoluir para continua-la.
O epistemológico marxismo “antropólogo genético”* no entanto, ainda não petrificado, é o melhor exemplo para observar que autor e obra são distintos. Aqui baseado na premissa de que a boa filosofia independe do instrumento criador para continuar a eterna mutante tentacular; contextualizante, aberta e continuamente receptiva em uma espécie de estado de proto agora, ininstagnável. Um organismo vivo muito além da vontade/capacidade daquele que, ainda que um gênio; é um homem pensante.

* “Marx tinha visto que as coisas sociais eram energia humana petrificada, portanto, reciprocamente, que as energias eram coisas sociais em vias de constituição ou de desintegração. Um problema central da história sociológica vem a ser o de mostrar como a energia se torna coisa (massa no sentido físico, instituição no sentido sociológico), como a massa se torna energia. A história é o polo energético, a sociologia o polo estrutural da nova e verdadeira ciência: a Antropologia genética.” p63





Seu "The ürbermensh"???

 “Na falta de um modelo, um tipo de homem seria meu ideal. Seu equilíbrio se modifica, se destrói e se reformula no campo de batalha das contradições. Ele não quer deixar o terreno das contradições. Não quer expulsar o negativo do mundo, mas participar de suas energias. Não quer destruir o positivo, mas resistir à petrificação. Não quer nem escapar ao real nem aceitá-lo, mas gostaria que o real fosse transformado e talvez espere que este real seja um dia transfigurado. Esforça-se para tornar criativa em si próprio a luta dos contrários. Tragédia e comédia, epopeia e farsa estão para ele indissoluvelmente presentes a cada instante. Ele se sabe enfermo, particular, mas o que o comove é a universal miséria de cada um e não a solidão. A solidão é a enxaqueca do mundo burguês. Este homem não odeia nada nem ninguém. Suas duas paixões são o amor e a curiosidade. Sua curiosidade é uma energia sem fronteiras. Seus amores não se excluem nem se tornam insípidos. Este homem adulto é, ao mesmo tempo, muito velho, criança e adolescente. Está sempre em formação. Obstina-se em procurar o além.” p68




Trechos

Contextualização (ou algo mais pessoal; tudo o que não regenera degenera)

Quem não está nascendo está morrendo” Bob Dylan (citado no livro insinuando a nossa obrigatoriedade à busca, à contextualização, ao sair da zona de conforto; ao não acomodamento).

Heidegger"o começo está aí. Não jaz atrás de nós... mas estende-se diante de nós" (idem). p22





 “...princípio primeiro da ecologia da ação, que nos diz que todo ato escapa às intenções do ator para entrar no jogo das inter-retroações do meio, podendo desencadear o contrário do efeito desejado.” p96




Sollen – Dever ser

         “O que resultará do encontro entre dever-ser e a realidade? O dever-ser se dissolverá na realidade anterior ou a transformará? Em que medida é necessário adaptar o dever-ser à realidade? Em que medida fazer composições, sem cair no oportunismo? Em que medida recusar transigir, sob o risco de nada fazer ou deixar-se exterminar? Teoricamente nada nos oferece o grau-limite de recusa e o grau-limite de aceitação para agir eficazmente. Cada situação requer sua estratégia e sua tática.” p43

“Só pode ser assim e, contudo, deve ser de outra forma.” p49





“entretanto, por mais repulsiva que seja, com sua podridão e sangue, com a purulência amarelecida da estultice, a política é também a única arte, a grande arte. Hoje todas as artes se esgotam, se exaurem, transmutam-se em ciência ou reconvertem-se em magia infantil.” p50

“A política é, ao mesmo tempo, demasiadamente carregada de problemas e demasiadamente esvaziada de pensamento.” P108





"Metamorfose ambulante"???

“O que fazer? Como dizer? É necessário ao mesmo tempo aceitar o que se recusa e recusar o que se aceita. É preciso exigir a totalidade e negá-la.” P59





Livro 
Em busca dos fundamentos perdidos
Sulina
 Edgar Morin



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