sábado, 25 de junho de 2011

Arte com seriedade


“Man sieht die Absicht und man wird verstimmt.”

[Você vê a premeditação e isso lhe estraga o estado de espírito.]
Goethe

Esta frase pinçada de Goethe e anexada por Liev Tolstói ao texto: Sobre Shakespeare e o Teatro (Um ensaio crítico – 1906), que se encontra no livro Os Últimos Dias, proporcionou-me uma felicidade bastante distinta. Já há algum tempo procurava uma forma de expressar as barbaridades das artes cênicas, cinematográficas e televisivas onde os diretores e afins não conseguem esconder a ação seguinte, vivem premeditando, crimes, climas e desavenças. Antes mesmo do meio de uma peça ou filme, novela nem conta, é possível entender oitenta por cento do que irá acontecer muitas vezes em detalhe.

Sou fã incondicional de William Shakespeare, sempre que me foi possível estive presente onde as adaptações remetiam a ele, não sei quantas vezes assisti RAN, por exemplo, um dos filmes de Akira Kurosawa e uma adaptação de Rei Lear. Portanto senti-me livre para acompanhar as observações de Liev Tolstói no texto acima citado, onde ele faz uma crítica até certo ponto ao próprio autor, embora isto precisamos dar um desconto, ou até crédito, sei lá, ao Liev devido a época em que viveu, talvez, não sei, digo sempre que precisamos ver tudo sob uma ótica, ou sob uma perspectiva adequada e agora isso não me é possível, porém ele está totalmente certo ao afirmar ou deixar sub entendido que existe uma supervalorização aos textos (conjunto da obra) do bardo, como seus defensores gostam de referir-se a Shakespeare. O que chama a atenção é que estas observações do Liev, neste ensaio, são do início do século passado, ou seja, nem de longe ele sonharia com a superexposição que tomou conta do mundo a partir dos anos 60, 70, onde todos, mesmo sem um mínimo de noção - logicamente - caracterizada por Liev Tolstói neste texto, afinal ele julga o momento por ele vivido, então; como entender o contextualizar suas observações hoje, quando qualquer um sai comentando, escrevendo e afirmando isto e aquilo de todos ou de tudo aquilo que possa gerar, de alguma forma, expectativa, comentários, notas ou até algum tempo de exposição!

Antes de tudo sua crítica serve, mais do que nunca, como um sinal de alerta. Em tempos de comunicação fácil e farta, onde vídeos são adulterados, textos plagiados, fontes corrompidas, e qualquer colegial ou mesmo criança manuseiam programas como o mega adulterador Photoshop, por exemplo, é muito fácil que dada a nossa efetiva carga horária de estudos, caiamos no lugar comum de acreditar que tudo pode ser, ou pior, é importante ou mesmo verdadeiro, sendo assim, como educar nosso senso crítico em tempo de informação rápida.
Isto, particularmente, serviu para mostrar-me que apesar no novo ser extraordinário e essencial devo tomar cuidado em que proporção estou substituindo (administrando) o novo sem valor pelo velho ainda eficaz.

-0-

Algumas das palavras fortes e cheias de significados do velho Leo retiradas do texto:

... imprópria para a época..., ...não agem de acordo com as respectivas personalidades, mas de forma arbitrária, multifacetados como as pessoas de verdade.., ...linguagem exagerada e vazia..., ...falsa e sentimental..., ...linguagem shakespeariana...

(Rei Lear não é uma peça original, foi tomada de empréstimo de uma peça chamada Rei Leir e esta peça antiga explica melhor a trama do que a adaptação arbitrária de Shakespeare)

Ele contesta o fato de que os personagens de Shakespeare são o auge da perfeição, repetido como uma verdade incontestável; entende ser exatamente o contrário. Observa que todos falam a mesma linguagem shakespeariana exagerada e insólita, - usando o termo “shakespeariana” de forma pejorativa - com incontinência verbal, falam muito sobre assuntos sem a menor relevância, visando a consonâncias e a trocadilhos mais que a pensamentos, todos falam de forma absolutamente idêntica, o delírio de Lear é em tudo idêntico ao delírio fingido de Edgar...,

013.d cqe