domingo, 3 de abril de 2016

Algo sobre a constância



Constância é também manter-se sereno mesmo que aquele a sua frente inadvertidamente afirme verdades quando sabemos que o tempo dirá que ele mente.



“Ator Rei: Acredito, sim, que [tu, atriz rainha] penses o que dizes agora; mas aquilo que decidimos, não raro violamos. O propósito não passa de servo da memória, de nascer violento mas fraca validade. E que agora, como fruta verde, à árvore se agarra, mas, quando amadurecida, despenca sem chacoalho. Imprescindível é que nos esqueçamos de nos pagar a nós mesmos o que a nós é devido. Aquilo que a nós mesmos em paixão propomos, a paixão cessando, o propósito está perdido.”

Shakespeare












“Aquilo que um homem diz, promete e decide na paixão deve depois sustentar na frieza e na sobriedade – tal exigência é um dos fardos que mais pesam sobre a humanidade. Ter de reconhecer, por todo o tempo futuro, as consequências da ira, da vingança inflamada, da devoção entusiasmada – isso pode suscitar, contra esses sentimentos, uma irritação tanto maior por eles serem objeto de idolatria, em toda parte e sobretudo pelos artistas. [...] Por termos jurado fidelidade, talvez até a um ser apenas fictício como um deus, por termos entregado o coração a um príncipe, a um partido, a uma mulher, a uma ordem sacerdotal, a um artista, a um pensador, num estado de cega ilusão que nos pôs encantados e os fez parecer dignos de toda veneração, todo sacrifício – estamos agora inescapavelmente comprometidos? Não teríamos enganado a nós mesmos naquela época? Não teria sido uma promessa hipotética, feita sob o pressuposto (tácito, sem dúvida) de que os seres aos quais nos consagramos eram realmente os mesmos que apareciam em nossa imaginação? Estamos obrigados a ser fiéis aos nossos erros, ainda percebendo que com essa fidelidade causamos prejuízo ao nosso eu superior? – Não, não existe nenhuma lei, nenhuma obrigação dessa espécie; temos de nos tornar traidores, praticar a infidelidade, sempre abandonar nossos ideais. Não passamos de um período a outro da vida sem causar essas dores da traição e sem sofrê-las também.”

Nietzsche


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