sábado, 18 de dezembro de 2021

Do medo de perder o controle que não temos

 









Ao final do filme O Exótico Hotel Marigold é possível concluir que aos personagens principais, todos velhos, a única saída é entregar-se a movimentação caótica de uma cidade do Rajasthan na Índia. Em síntese, aqui nascemos e somos obrigados ao existente assim como os velhos chegam a um local com suas vontades e costumes, porém não é possível que mudem nada, ou se adaptam ou fogem. No caso, uma única não se adaptou, os demais não apenas o fizeram como tiveram suas vidas transformadas, ou seja, aglutinaram o apreendido com o desconhecido, ampliando e aprimorando vontades inseridos no mesmo caos absurdo inicial a sempre referenciada cultura inglesa. Diferentemente de nós, que não sabemos nada de nada quando chegamos aqui; nossa ancestralidade foi momentaneamente apagada e o mundo, qual mãe de inúmeras tarefas, mostra algumas direções ao rebento, momentaneamente, desmemoriado; o que, a cada século que passa, não é revelado, ou fica geração após geração velado: é que, podemos sim acessar o que foi apagado com o renascimento, e que isso é uma espécie de iluminação. Mas é preciso lutar muito, querer. Um querer até então desconhecido; para acessá-lo acima das vontades que criaram para nós durante toda uma vida.

 


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Vivemos no fio da navalha e, ou não queremos acreditar ou nem mesmo supomos tal urgência eminente. Desse grupo, que não quer acreditar, existe um nicho que está por um fio. Não admitem e mesmo lutam contra a vida que estão vivendo e não me refiro aqueles perdidos, alienados de tudo, estou aludindo aos letrados, aos mais conscientes, as pessoas que dominam minimamente seus poderes de decisão ainda que saibam que não possuem o controle e não entendem porque não conseguem se ver em paz com o até aqui conquistado e quando sós imaginam que esse fardo: compreender que neste Plano Terra estamos à mercê do mundo físico; talvez fosse melhor desconhecer ou não ter atingido esse grau de entendimento.






Conquistar determinado grau de conhecimento com respeito ao nosso existir é bastante perigoso, ainda que todos, inexoravelmente, passaremos por isso, porque, concomitante a isso é normal as responsabilidades concernentes e com elas a necessidade de optar se se dedica ao avanço ou retorna ao estado anterior e o transforma em seu último porto seguro em um sorvedouro inerte de vontades.








Se é raro é caro - Atingir a percepção de não-controle expõe os membros desse grupo à percepção clara de que o jogo das esferas invariavelmente chega amparado por certezas inequívocas a esquecer alguns dos principais mecanismos ferrenhamente defendidos até então; então como abandoná-los ao descobrir que tudo fez parte de uma armação bem montada. Como aqueles andaimes de tubos utilizados para as restaurações. Como entender que tudo, naquele instante, quando o indivíduo está formado, consciente e precisa acreditar apenas em si, desmontar as amarras que o levaram até este momento almejado?








A todo instante, com um tempo maior com o passar do tempo, é inevitável que o material escolar utilizado na última turma seja abandonado para a aquisição de livros e cadernos mais sofisticados; quando isso não acontece, significa que estamos repetindo etapas.






A boa comunicação, a comunicação que evolui, precisa fazê-lo se restringindo. Com o passar dos anos deve ser cada vez mais: comunicável a um número menor de ouvintes; pois é fato que não há uma evolução coesa ao que busca libertar-se da Roda de Samsara.








O Plano Terra é também um Plano de Expiação, um Plano Laboratório, um Plano Estação, um Plano Escola, didático, aberto e liberado a todos os tipos de experiências. A diferença dos correspondentes a estas expressões é que de uma forma ou de outra sabemos, muito por entendimento comum, o que significa “expiar”, “pesquisar”, uma “parada de ônibus”, a “escola”, porque aprendemos através do “didatismo” que aglutina nossas comunicações. Desvincular-se do aprendido, do didatismo comum é tarefa difícil porque o mundo vem demonstrando/conduzindo às melhores formas de escolhermos o que mantém um equilíbrio mínimo para que nossas vidas se mantenham dentro destas opções orquestradas. Daí reaprender entendendo que existem caminhos outros, “não permitidos”, “não aconselhados”, ainda que sãos, ou melhor, oportunidades outras fora do que é considerado suficiente para o bem viver de todos, irá exigir um empreendimento totalmente oposto ao caminhar conjunto, no sentido de que todos poderão opinar sobre a nova escolha e essa não é uma opção viável, afinal, a comunicação com o grupo não é mais possível.






Este caminhar é silencioso e aqui ele difere dos dois grupos do início desse exercício, quando utilizei a expressão “nicho”; fatia, porção, portanto, plural. Ao chegar aqui o indivíduo se torna individual, quase único – ainda assim não se entende. Ele verte, é expulsado das celeumas, salta do andaime, corta o cordão sem imaginar se há algum anteparo, alguma base... e não há, não na forma que conhecia. Agora ele se apegará ao tronco que encontrar - porém assim não morrerá - até largar também esse. Agora já não há mais morte. O que morre a partir daí, justamente, é o descanso eterno.






Quando bem pensado, pensado com inteligência, pensado sem o que se sabe, pensado sem a balburdia, pensado mesmo sem os ruídos da nossa cabeça, descobrimos que não temos controle sobre nada – mas isso não é ruim, é importante que assim seja até que... Não, digo, a sociedade não nos ensina como nos desligar dela; e nem poderia. Somos diferentes do meio gerado: orgânico, maquinal, material; e a matéria são moléculas que se transformam dando vida a outras moléculas, e isso só temos agora, e ainda que isso possa parecer lindo e humano, é limitado. Somos mais e podemos ser conectados no além matéria, poderemos um dia, TODOS, dar o salto.







Quanto somos obrigados a situações que não controlamos. Às leis, ao convencionado, às normas, a química, física, matemática. E em meio a tudo; é preciso lidar com a ignorância daqueles que não estão nem aí para essas e ainda menos para qualquer um dos valores que insistimos em conservar.






Quanto temos medo de mudanças que levarão a nos soltar, a aos poucos nos desprender - à libertação para um devir aleatório, apenas conscientes de que estamos fazendo o nosso melhor!?!

 

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 “... mas, as vezes, o que acontece é que é bom. ”

“Hotel Marigold, Jaipur, nono dia. Os velhos hábitos se vão e adquirimos outros. Assim que me levanto de manhã procuro pela Rádio 4. As notícias me chegam pelo Jaipur Herald. Há pouco me acostumei ao ruído de buzinas e ambulantes. Haverá outro lugar no mundo que assalte de tal forma os sentidos? Os que conhecem o país há tempos, apenas cuidam de seus negócios. Mas nada pode preparar um recém-chegado para esse escândalo de ruído e cor, para o calor o movimento, o constante tumulto de gente. Sonny conduz seu próprio assalto aos nossos sentidos com inúmeros pratos exóticos saídos da cozinha a cada dia. ‘Mooli moong dall’, ‘bagara baigan’, ‘banjara gosht’, ‘paneer meehti chaman’, ‘mutton vindaloo’. No início, você se assusta. Mas pouco a pouco percebe que é como uma onda. Resista, e você cairá. Entre de cabeça, e sairá do outro lado. É um mundo novo e diferente. O desafio é enfrentar. Não só enfrentar, mas seguir adiante. ”

 – No filme O Exótico Hotel Marigold








 

 

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