sábado, 8 de novembro de 2025

"trezentas fachadas"

 














“Os maiores acontecimentos e pensamentos — mas os maiores pensamentos são os maiores acontecimentos — são os últimos a serem compreendidos: as gerações que vivem no seu tempo não vivenciam tais acontecimentos — passam ao largo deles. Ocorre algo semelhante no reino das estrelas. A luz das estrelas mais distantes é a última a chegar aos homens; e enquanto ela não chega, os homens negam que ali — haja estrelas. ‘De quantos séculos precisa um espírito para ser compreendido?’ — eis aí também uma medida, com que se estabelece uma hierarquia e etiqueta de que há necessidade: para o espírito e para a estrela.”












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“Viver como uma imensa e orgulhosa calma; sempre além. — Ter e não ter espontaneamente nossos afetos, nosso pró e contra, condescender durante horas com eles; montá-los como cavalos, frequentemente como asnos: — precisamos saber usar sua estupidez tão bem como seu fogo. Conservar suas trezentas fachadas; e também os óculos escuros: pois existem casos em que ninguém nos deve olhar nos olhos, menos ainda no ‘fundo’. E escolher como companhia esse vício velhaco e jovial, a cortesia. E continuar senhores de nossas quatro virtudes: coragem, perspicácia, simpatia e solidão. Pois a solidão é conosco uma virtude, enquanto sublime pensador e ímpeto para o asseio, que percebe como no contato entre as pessoas ­— ‘em sociedade’ — as coisas se dão inevitavelmente sujas. Toda comunidade torna, de algum modo, alguma vez, em algum lugar — comum, vulgar.”


Nietzsche em, Além do bem e do mal









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