“Os maiores
acontecimentos e pensamentos — mas os maiores pensamentos são os maiores acontecimentos
— são os últimos a serem compreendidos: as gerações que vivem no seu tempo não vivenciam tais acontecimentos — passam
ao largo deles. Ocorre algo semelhante no reino das estrelas. A luz das
estrelas mais distantes é a última a chegar aos homens; e enquanto ela não
chega, os homens negam que ali — haja
estrelas. ‘De quantos séculos precisa um espírito para ser compreendido?’ — eis
aí também uma medida, com que se estabelece uma hierarquia e etiqueta de que há
necessidade: para o espírito e para a estrela.”
*
“Viver como
uma imensa e orgulhosa calma; sempre além. — Ter e não ter espontaneamente nossos
afetos, nosso pró e contra, condescender durante horas com eles; montá-los como
cavalos, frequentemente como asnos: — precisamos saber usar sua estupidez tão
bem como seu fogo. Conservar suas trezentas fachadas; e também os óculos
escuros: pois existem casos em que ninguém nos deve olhar nos olhos, menos
ainda no ‘fundo’. E escolher como companhia esse vício velhaco e jovial, a
cortesia. E continuar senhores de nossas quatro virtudes: coragem, perspicácia,
simpatia e solidão. Pois a solidão é conosco uma virtude, enquanto sublime
pensador e ímpeto para o asseio, que percebe como no contato entre as pessoas —
‘em sociedade’ — as coisas se dão inevitavelmente sujas. Toda comunidade torna,
de algum modo, alguma vez, em algum lugar — comum, vulgar.”
Nietzsche em, Além do bem e do mal
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