sexta-feira, 17 de julho de 2009

Sobras de uma guerra particular



Ao final do filme Charlotte Gray – Paixão sem Fronteira; quando a personagem, vivida por Kate Blanchett, retorna à França de trem, consegue o diretor passar a sensação indizível de paz, aquela sensação sem par onde suspiramos aliviados depois de terminado um pesadelo, no caso, a pior guerra por nós seres humanos até então vivenciada.
Como um incansável descontente, obviamente é está uma visão mentirosa; isso dá-se, por tratar-se eu apenas, de um eterno buscador de sentido para o existir, me pego olhando acima da caixa que transmite o final da película, e numa síntese do que foi meu existir até então, ou seja, que jamais me atenho, mesmo por um momento sequer, regozijando-me, quando é natural o refestelar-se, raramente junto-me aos demais, aproveitando os louros da vitória, se por alguma razão o faço, é de forma contida; comedido.
Recuperando então, ali também, de imediato, meu ar de seriedade, não me deixo contaminar pelo engano fácil dos prazeres que advém de um momento que em situação alguma é de calar-se, e aceitar a paz finalmente ditada por àqueles comandantes que mais cansados que envergonhados assinaram.
Não serei eu mais um a mostrar os dentes em um dos momentos mais tristes da história.
O que tínhamos a comemorar nós, sobrevivente da barbárie?
Nada. Então não seria uma “paz” divulgada por aqueles que foram tão culpados quanto o inimigo, que por-me-ia a beijar doidivanas disponíveis nos portos do mundo.
Paz não. O cessar daquelas atrocidades sem fim deveriam sim ser comemorado, porém, jamais com um espírito de alegria, muito menos de felicidade, foram momentos de muita dor para os humanos, mesmo assim, como sempre, deixando-nos enganar por aqueles assassinos que investidos de justiceiros continuariam governando; comemoramos como se todos os nossos problemas tivessem acabados, e mais, talvez seja por isso que ainda hoje vivamos como ridículos, acreditando, talvez no íntimo, que tudo é permitido, ou pelo menos possível, afinal sobrevivemos a segunda grande guerra e então podemos viver disso, que para muitos pode ser considerado como algum tipo de lucro, ou como se tivessem sido abençoados por Deus, poupados, e agora nada mais importa.

Somos os sobreviventes da guerra.
Sobrevivemos à maior atrocidade jamais vista neste planeta.
Porque deviríamos nos preocupar desde então com o que Realmente importa?
Já tivemos o suficiente suportável; porque não, agora,
apenas aproveitar?


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