sábado, 6 de fevereiro de 2021

Boa praça





Este apontamento

é dedicado ao Chiquinho Hass,

o cara mais boa praça que já conheci

e a inspiração para o exercício de hoje.







O cumprimento é lindo. Ele abre portas, desarma, está ligado a empatia, amizade, cordialidade, gente de bem e muitas vezes obriga até o mais fechado dos taciturnos a esboçar um sorriso; ação mais do que comum e representação maior da pessoa que os antigos chamavam de “boa praça”.


Há dezessete anos trabalho em um Condomínio Industrial, com dezenas de empresas instaladas ou representadas. Passei por algumas delas até ingressar na tão sonhada empresa mãe; a multinacional responsável por todo o processo. Não é um super condomínio, portanto conheço, ao menos de vista, todas as pessoas. E acredito que a grande maioria delas reconheço por nome ou apelido ou mesmo as cumprimento sem nem mesmo ter trocado – ainda - uma única palavra com elas.



Ontem me deparei novamente com a famosa frase de Alexandre, o grande, “Lembre-se que é da conduta de cada um que depende o destino de todos”. 

Porém é com tristeza – e por isso não vou me ater a ela - que aponto neste exercício que até o ato de cumprimentar está deteriorado. 

Algumas pessoas não conseguem se atentar para o simples a aí permanecer – e a cordialidade é a mais simples das práticas.





Tive um ótimo professor na adolescência, porém não recordo seu nome, também não é pra menos, mas lembro como nos causou espanto à época ele confirmar que não se chamava Francisco, nós o conhecíamos – toda a cidade de Matelândia, aliás – por Chiquinho; um baita de um alemão em todos os sentidos mais queridos que se possa imaginar, goleiro do Aymoré. É claro que o Hass seu sobrenome, descobrimos depois. Seu nome também, mas este se perdeu depressa; desapareceu como chegou e manteve-se o “Chiquinho”. Uma figuraça. Precisaria de um dia inteiro para falar deste homem singular que cruzou esta minha caminhada; ”gente finíssima”. Nunca mais o vi ou soube nada dele; há mais de quatro décadas.

Depois desenvolvi a empatia profissional por quase duas décadas sendo vendedor, é claro que neste meio fui obrigado aos jogos do cumprimentar plástico dos adultos, coisa que na adolescência pura da cidade pequena a gente não jogava.



E por último, no início do novo século, a etapa que persiste até então, no Condomínio Industrial. Caí de paraquedas, costumo afirmar. Deslocado; tudo era muito novo. Inicialmente coloquei o cumprimento adulto para funcionar, mas, com o passar dos anos comecei a separar o joio do trigo, pois entendi com outros mestres que a humildade, o reconhecimento, o respeito, precisam estar presentes na minha conduta independentemente do que o interlocutor pensa. É claro que na profissão de Representante Comercial meu cumprimento sempre seria visto como alguém que quer lhe empurrar algo, porém ao trabalhar na indústria, caminhando para virar meio século de vida, a gente precisa aprender, e aos poucos fui perdendo os vícios nocivos do negociador e voltando a prática do “Velho Mestre” de saudar os colegas e a chefia com a naturalidade de uma pessoa comum. Isso se tornou mais fácil porque neste ambiente só precisamos fazer o que foi acertado em contrato a ser executado - caso se trate o colaborador de um bom profissional. E a partir deste histórico tirei algumas conclusões que os anos me mostraram ser válido aplicar e o verdadeiro mote deste texto.




Como regra número um, por exemplo, entendo que se deve fazer referências, ou como se dizia antigamente “as vênias” a todos que passam por você quando demonstram que foram notados. A segunda é mais difícil. Adquirir sensibilidade suficiente para nunca, jamais, virar-se quando alguém que se sinta inferiorizado passe por nós – aqui precisamos de um pouco de tato, psicologia e entendimento.

A chefia, ou os superiores hierárquicos são um caso a parte, eles sempre pensam que você quer algo, então, se possível, cumprimente de longe, eles ficam mais confortáveis – se quer alguma coisa, aprenda a agir com segurança. Invariavelmente estragamos nosso “cartão de visitas” se nos aproveitamos dele para emparedar interlocutores.



Guarde um tempo para os mais efusivos, sempre teremos um minuto a mais para ouvir alguém que demonstra gostar da gente. Ouça os problemas, ou aqueles lamentos rápidos, de passagem – todos somos iguais, mas as personalidades são distintas. Porém não acumule ninguém com suas queixas. Lamentar-se gratuitamente é aproveitar-se da boa vontade alheia. Não há problema que não possa ser deixado de lado no momento de um abraço fraterno.



E ainda que não esqueçamos que existem casos e casos; feliz é a pessoa que adquire o hábito de cumprimentar a todos pelo simples prazer da saudação e, entre as mais tocantes lições sobre esse assunto nestas seis décadas de vida, jamais me esqueci da aura, da magia – em tempos de esperança e expectativas espontâneas - assistida no cumprimento descompromissado do meu velho amigo Chiquinho.

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