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sábado, 11 de outubro de 2025

Pharmakon

 







 

 

“É uma coisa criar as artes; outra, bem distinta, é discernir o bem e o mal que elas podem trazer.”

Thamus; Rei Egípcio

 










(...)

Sigamos, pois, adiante.

Enquanto se preparava para atravessar o rio e partir, Sócrates hesita, pois Fedro lhe pede que fique, ao menos até que o calor diminua, lembrando-lhe que é meio-dia, o que os antigos chamavam de “limite fixo” ou “meridiano firme”: a hora que a terra não projeta sombra e a luz reina por toda parte. É nesse exato instante que Sócrates recebe um sinal de seu daimonion, convidando-o a permanecer.










Ali, onde a verdade dispensa intermediários, o discurso de Sócrates começa a fluir como nascente sagrada, elevando-se da terra ao céu. Eventualmente, ele passa a falar da palavra viva, e evoca o mito de Theuth (Thoth), o antigo deus egípcio a quem se atribui a invenção da escrita. Thoth julgava estar oferecendo à humanidade um grande dom: por meio da escrita, os egípcios se tornariam mais sábios e não esqueceriam mais. Teriam, enfim, um remédio contra o esquecimento. Como disse o próprio Thoth: “Para a sabedoria encontrou-se a cura.”

Assim pensava. Assim esperava.










Mas o rei Thamus respondeu a Theuth que sua invenção não trariam os frutos esperados: “Sábio Theuth, é uma coisa criar as artes; outra, bem distinta, é discernir o bem e o mal que elas podem trazer. Com amor e inocência, ofereceste à humanidade o dom das letras, mas não lhe deste a memória. Ofereceste o esquecimento, pois, ao se apoiarem na escrita, os seres humanos esquecerão como olhar para dentro de si mesmos, como haurir das próprias profundezas a luz viva da recordação. Não encontraste o remédio que cura, mas um sucedâneo que entorpece. Não ofereceste a Sabedoria, mas sua sombra, uma aparência ilusória. E as multidões, excitando muito e aprendendo pouco, crerão que sabem, quando, na verdade, permanecerão vazias, ignorantes, portando a reputação de conhecimento em lugar da Sabedoria Verdadeira.”

Em, “A menor sombra e a maior luz”; Revista Sophia Nº. 117 - p.32 por Erica Georgiades

 



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Antes eu deveria amar o breu. Ao ter nascido na luz, tudo vejo, tudo é demasiadamente claro, porém, ao enxergar sem compreender, até que alguém me esclareça, o que tenho é tão somente a ilusão da certeza. Antes, deveria escutar o medo, me deitar sobre a dúvida que é fruto do ébano, e daí trabalhar a coragem e o entendimento. O ser que busca a Verdadeira Luz, reconhece, que o exagero e a abundância cegam, então representam o buscador portando um archote, porque não é na grande luz que encontramos o que não imaginamos existir, e sim, no pequeno lume que aos poucos se desvela ao que busca: a clareza que liberta.










A palavra escrita não é vida, e sim, deve servir mais como instrumento que aviva todo aquele que busca a dela servir-se, como uma senda ao Verdadeiro Verbo que pode nos levar a suplantar o véu do obscurantismo.

(Fragmento inspirado na matéria “A menor sombra e a maior luz” de Erica Georgiades.

 









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