sábado, 28 de janeiro de 2017

Presos a vontade




“Os assassinos estão livres, nós não estamos.”, canta Renato Russo. Dirijo-me as poucas mentes sãs – e que, a despeito da escandalosa torrente de ofertas ao dolo, assim pretendem continuar – capazes de compreender essa linguagem. Nosso estado atual tem presos a vontade - demais e livres. Ortodoxamente não há o que ser feito. Os comandantes “evoluíram” diametralmente na direção oposta aos comandados – se não pessoalmente, obrigatoriamente. A partir desta premissa imperiosa (a liberdade alcançada à custa do poder sob o subterfugio de sociedade organizada) tudo o que acontece - tudo mesmo - pode ser usado a favor do grupo que evoluiu no sentido ou na ação de subjugar. Como paliativo: a passividade em nome do bem estar e da segurança sob os “auspícios” da famigerada e assumida justificativa de escolhas – onde é assumida a condição por conta de uma desculpa absurda qualquer que se não engana ninguém serve para manter-se prostrado. Talvez a posição mais correta resida na ciência individualíssima – não resignada negativamente, mas assumidamente - de um que outro avesso ou cansado do desconforto continuado, do segundo grupo, decididos a não sofrer duplamente: por conta da carga normal a que está submetido e à situação fisiológica da ânsia de assistir prevendo um futuro melhor que não virá. Achaques proporcionais; este é o futuro para aquele que não se moldar a nova (ainda e por muito camuflada) velha (há tanto estabelecida) onda que pode também considerar acertadamente o governo – por razões diversas - como uma milícia enrustida. E a partir daí, cultivada a conscientização deste claustro nada psicológico; reconhecida a tão urgente quanto necessária compreensão desta liberdade prisional: a criação de um Plano Exclusivo* onde se possa viver a própria e sã realidade individual assim que executadas todas as obediências burocráticas obrigatoriamente inventadas para manter o “estado de direito”. Tão infeliz quando prudente (a prudência é irmã da sobrevivência não da felicidade), esta é a acomodação mais acertada à viver sua liberdade vigiada e então finalmente sair da solitária imagem de eterno desconfortável que anseia ao disputado naco prometido e assumir a nova condição acatada, e só assim, ter direito ao banho de sol com algum grau de sossego. Vislumbrando as paredes invisíveis, porém seguro de que ao ser abordado as humilhações serão apenas as de praxe se estiver quite com as prerrogativas que lhe facilitam a manutenção deste “privilégio”. Por que, ao contrário do que entendemos por prisão no nosso dia-a-dia: não podemos nem mesmo conjeturar uma rebelião, um motim. Ao contrário da literalidade do assunto, não nos valemos nem mesmo de uma única bala na agulha para barganhar. E não apenas por conta da nossa pureza de pensamento – ajustados ao entendimento posto; quando no mais das vezes temos a firme “convicção”, por nos entendermos parte do processo, e crentes –, e mais adequado: as manjadas, mas recorrentes e ordinariamente implantadas, esperanças; que nos fazem “compreender” e (a cereja do bolo) aceitar o que vem sendo anunciado. Portanto, ainda que não percebendo a saída, caso houvesse a possibilidade de uma única melhor, a brutalidade de antigas escolas não deixam dúvidas que, se causarmos distúrbios à ordem sem o consentimento (há uma gama de possibilidades enorme aqui) armado e arranjado da Milícia Governo, é certo que aí sim, seremos realmente presos; presos literalmente por conta do sacrilégio de não entender a liberdade conquistada à custa de muito sangue de nossos heróis condecoradíssimos. E não há nada que possa ser considerado mais infame; mais degradante, que não honrar aqueles que politicamente lutaram[1] por um futuro de igualdade.

Not chains around my feet, but i´m not free - BM 

Invisibilidade conquistada – “1984” e suas câmeras vão longe; um pensamento tornado obsoleto para um governo que não precisa coagir, agredir, maltratar e confinar para obter a obediência; eles sim, finalmente adquiriam experiência, sabedoria e inteligência. Jorge e tantos outros tão somente lhes deram material; visionários, os muniram com suas inteligentes alusões extemporâneas demostrando que se não se pode nascer inteligente, nada impede que se adquira conhecimento para entender a mecânica de quem a possui, e por fim, não sem antes sofrerem aos borbotões, estão indo à forra em como não fazer, e afinal, fazer bem feito, ainda que, primeiramente[2], em benefício próprio. A partir destes arremedos de perspicácia, tudo vem sendo rearranjado e daí foi delineado um novo caminho onde não existe o "Grande Irmão"; todos somos “irmãos” fraternos e buscando um novo futuro, ainda que ninguém saiba que a separação jamais foi tão evidente. Por sua vez, ponto ao sistema político que aprendeu que há mais desafogo em se preservar pequeno. O mega estado das conquistas imperiais era um sonho utópico de anômalos conquistadores do passado que não terá mais lugar no futuro – aprenderam também, que dividir o butim traz menos riscos a todos eles. Compreendeu-se que em um estado de fácil dirigibilidade, uma vez instaurada a política cooperativamente amarrada. Há que se lidar tão somente com pequenos grupos que destoam do pensar unificado do contingente público, estancando as destoadas células ulcerosas que podem chegar no máximo a dois desvairados (não detectados por conceituadíssimos profissionais do Ministério da Psicologia) por ano que resistem de forma mais contundente, ao espalhar alguma desordem (possivelmente letal – furúnculos sociais - Alguns deles nascido do próprio meio doente, ou ainda, pode ser classificado como insano, por não passar de outro desnorteado que percebeu alguma realidade escondida). Sempre, prontamente abafada. Porém no mais das vezes, a um grupo preparado é fácil contê-los quando toda a prole esta bem suprida com água e pasto, ou simpaticamente falando, quando em seu ambiente passivo buscam a continuidade do ajuste, ou ainda, entende um que outro que, como fez referência o Pernalonga: aqui, “só estamos de passagem”.
As observações aqui anotadas não vislumbram em nenhuma hipótese, revoltas particulares, nem mesmo aludem a alguma solução utópica, muito menos o sempre desesperador e incompreendido niilismo é uma proposta de saída – afinal ele não existe enquanto não for exaustivamente meditado. Este é tão somente um exercício de escrita, nada aqui é sério o suficiente para uma tomada de decisão, no entanto, assumida a posição de miserabilidade, observado a inegável falta de poder de negociação, é certo que o menos inteligente é a revolta; onde sofremos, na melhor das hipóteses, em dobro. Assumir a precária condição com equilíbrio e lucidez é sempre a solução mais saudável.


*Plano Exclusivo – Pode ser entendido como um consciencioso estado individual adquirido. Resumidamente explicado: é entender e buscar conquistar parcial (nossas ações e conquistas individuais, precisamos entender, sempre estarão sujeitas a algum governo maior) porém, paulatinamente, a posição o mais próximo possível de uma condição autossuficiente de coexistência; permitindo que apenas às influências e interferências positivas acessem o espaço delineado e subjetivamente esquadrinhado e, através de um conhecimento razoável, não permitir que o externo negativo – ainda que compreendido e respeitado - interfira no equilíbrio desse estado conquistado.

Em tempo: Plano = Esfera, domínio, área, universo.




"Ter que ir embora, Querendo ficar.
Que vida é essa que não podemos escolher onde queremos estar?!
Seria medo ou correntes?
Se for só medo, não alimente.
Se for correntes, argumente!”
Estabilidade financeira pra viver só depois dos 70?
Mas que vidinha mais azarenta!
Eu quero é um lugar quente pra morar
Quero água bem pertinho pra mergulhar.
Quero florescer.
Renascer.
Ser.
Me devolver!
E se esse medo não me engolir, vou escolher viver com pouco
Quebrar as correntes desse mundo louco.
Só que viver com pouco
É pedir muito.
Porque o intuito é sair desse circuito!
É ter uma terrinha pra plantar
Cultivar e sem veneno cozinhar
Ter a natureza imponente pra contemplar.
Olhar nos olhos.
Trocar sorrisos
Escolher amar.
Mas essa vida diferente
Não é o que esperam da gente!
E a exploração latente?
E o lucro permanente?
Realmente seria muito imprudente
Se libertar das correntes!".

O Poema final é uma contribuição de Jasi Machado





[1] Somente é possível desvendar o real significado da expressão, esmiuçando as três versões que subjetivamente acompanham uma ação; versão um, dois e verdadeira.
[2] Aqui, uma réstia de Esperança Real.










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